sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

CONTAGEM REGRESSIVA: TRÊS...



O Velho "Briza"

Caro Leonel Brizola, Lula chegou lá. E não só chegou lá como ajudou a eleger a sucessora, Dilma. Lembra dela, não? Isso, secretaria de energia do Rio Grande do Sul. Veio do PDT que você fundou, depois daquele passa-moleque que levou na disputa pela sigla "PTB".
Pois é. A direitona, os maus empresários, a imprensa danosa à informação livre tiveram que engolir o "Sapo Barbudo" durante 8 anos ou mais. Mss você, ao contrário do que disse em 1989, por ocasião do segundo turno das eleições para presidente, não precisou engoli-lo, apesar da expressão ter sido criada por você para valorizar o seu apoio.
Há muito tempo você já sabia que Lula era "o cara". Estava escrito numa estrela. Mas o que não foi dito ainda é que você também foi "o cara", que enfrentou a ditadura e os ditadores de plantão. Não chegou lá, na Presidência, mas entrou para a história pela porta da frente. Fica o registro. Uma singela homenagem ao velho "Briza". No video, discurso de Brizola em Bagé (RS), em 1998, como candidato a vice na chapa de Lula.

CONTAGEM REGRESSIVA: QUATRO...









1989, o ano que não acabou

Na cabeça da maioria dos militantes veteranos, a derrota de Lula para Collor em 1989 não foi deglutida até hoje. É mais ou menos como no futebol: seu time é melhor, está jogando o fino da bola, prestes a se tornar campeão, mas, aos 45 do segundo tempo, leva um gol impedido e o adversário fica com o título.
O gosto amargo na boca permanece até hoje. Tínhamos certeza da vitória. Comícios gigantes. Garra dos militantes. Apoios de políticos de peso, como Brizola, Arraes e Covas. Participação massiva dos principais artistas nacionais. Apelo popular. E um adversário com um passado ligado à ditadura, aos usineiros, à escória da política brasileira, com um discurso populista ao extremo.
Mas Collor tinha o apoio da rede Globo. Da direita organizada. Dos empresários. Da imprensa golpista. E fez uma campanha baseada no ódio, na ameaça vermelha e na especulação da vida particular de Lula, como mostra o depoimento da ex-namorada, que o expôs na TV como um quase delinquente.
A grande pergunta que fica, que resiste ao tempo, é: e se Lula tivesse ganho aquela eleição? Sob certos aspectos, é difícil responder, pois a conjuntura política hoje é outra. Mas de uma coisa eu tenho quase certeza: o Brasil não mergulharia tão facilmente no neoliberalismo. Muitas estatais seriam preservadas, muitos empregos estariam garantidos. Sairíamos da posição de subserviência às grandes potências mundiais com maior rapidez.
Nesses 21 anos que nos separam de 1989, Lula disputou outras eleições presidenciais, perdeu mais duas, ganhou outras duas, está se despedindo de Brasília com aprovação máxima, com um desempenho semelhante ao que esperávamos já naquela época.
Só que 1989 não acabou. Permanece entalado na garganta, pois provocou graves reflexos na sociedade brasileira nos anos que se seguiram.
Veja nos videos acima momentos históricos daquele embate. Lula ao lado da filha, respondendo à baixaria de Collor sobre o seu envolvimento com a ex-namorada. Duas esquetes com a turma da TV Pirata, programa de grande sucesso na época. E preste atenção no encerramento da campanha no Rio de Janeiro. Covas discursa com vigor, levando a tucanada a apoiar o candidato da Frente Popular. E Brizola vibra muito a cada palavra de Lula. Vibra como se tivesse dado um grande passe para o gol. Pena que bateu na trave.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

CONTAGEM REGRESSIVA: CINCO...



Originalmente, os textos acima foram publicados em páginas duplas no livro citado. As imagens acima foram remontadas para efeito de diagramação do blog. O conteúdo permaneceu inalterado.

 O amigo Henfil

A luta pela redemocratização do Brasil passou pelo cartunista Henfil. O seu humor cáustico, muitas vezes iconoclasta, irreverente, teve a função para expor as mazelas do Brasil durante a ditadura. Graúna, Bode Orelana e Zeferino apontaram as diferenças cruciais entre o Sul Maravilha e as agruras do Nordeste. Os fradinhos fizeram a crítica dos usos e costumes de boa parte dos brasileiros, principalmente dos valores adotados pela classe média na época. Que prato cheio, eles teriam hoje, não é mesmo?
Naturalmente, Henfil foi um grande apoiador da novidade política dos anos 80: o PT. E, ali, naquele campo progressista que começava a renascer, construiu com Lula uma grande amizade. Os textos acima foram extraídos do livro "Diretas Já", publicado em 1984, quando o movimento pelas eleições diretas para presidente era forte. Eles resumem bem como foi a campanha a governador do PT em 1982 em São Paulo, a primeira candidatura de Lula em sua trajetória política.
Lula ficou em quarto lugar. A bancada do PT na Câmara Federal foi pequena. Mas é preciso fazer a ressalva de que o partido tinha poucos recursos, o voto era vinculado (só era permitido votar em candidatos do mesmo partido), a propaganda era baseada na Lei Falcão (só apareciam fotos e currículos dos candidatos) e o PMDB surgiu como uma verdadeira máquina de angariar votos, até por ter sido a única oposição tolerada pela ditadura antes da adoção do pluripartidarismo planejado por Golbery do Couto e Silva.
Henfil faleceu em 1988, vítima de de Aids. Assim como seus irmãos: o sociólogo Betinho, aquele da música "O Bêbado e o Equilibrista", e o músico Chico Mário. Hemofílicos, foram contaminados numa época em que ainda não havia controle algum sobre o sangue utilizado nas transfusões. Além dos primorosos e sempre atuais cartuns, sua vasta obra inclui livros, revistas, um filme, chamado "Deu no New York Times", e as famosas Cartas à Mãe, publicadas na revista Isto É, em vários jornais e na revista Fradim. Também chegou a ter um programa na TV Globo.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

CONTAGEM REGRESSIVA: SEIS...



Viagem no tempo: fundação do PT

No trecho do programa Globo Repórter de 2002, feito especialmente para Lula após a vitória na eleição daquele ano, Lelia Abramo nos conduz a uma viagem no tempo: Colégio Sion, em São Paulo, palco da Assembleia de Fundação do Partido dos Trabalhadores, em 1980, sob o clima das greves dos metalúrgicos que acuaram o governo militar de João Figueiredo.
Na entrevista, ela comenta como foi o primeiro contato com Lula e como o seu carisma ajudou o PT a se transformar rapidamente num partido popular. “Estávamos em um fusca quando ele me disse que tinha a intenção de fundar um partido”, contava Lelia sobre o seu relacionamento com o líder sindical.
Atriz e socialista, ela faleceu em 2004, aos 93 anos. Sua trajetória é marcada tanto pelo talento nos palcos como pela organização da classe artística - presidiu o Sindicato dos Artistas de São Paulo e obteve importantes vitórias, como a obrigatoriedade de registro para trabalhar como ator profissional. Lelia Abramo foi uma das signatárias da ata de fundação do PT.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

CONTAGEM REGRESSIVA: SETE...


O fio da meada
Faltam alguns dias para Luís Inácio Lula da Silva completar o ciclo iniciado no final dos anos 70, em plena ditadura militar, quando comandou as maiores greves já ocorridas no Brasil, sob um regime que ainda fazia uso da força e da doutrina de segurança nacional.
No dia 31 de dezembro de 2010, Lula deixa a Presidência da República após 8 anos de governo - dois mandatos - e um recorde de aprovação popular, acima dos 90%, que contribuiu para eleger sua sucessora no Planalto, Dilma Roussef. Sem dúvida, é o maior líder político brasileiro pós-ditadura.
Aqui, em "Contagem Regressiva", relembramos grandes momentos de Lula, de sua trajetória política. O fio desta meada histórica são as greves dos metalúrgicos do ABC.
Veja acima cenas do documentário "ABC da greve", de 1979, dirigido por Leon Hirszman, recuperado pela Cinemateca Brasileira. No filme, Lula, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de S. Bernardo, lidera a greve de 1979, que colocou em xeque o governo militar de João Figueiredo.
Num primeiro momento, o sindicato sofre intervenção. Lula e os demais dirigentes são cassados. Mas logo o governo recua, devolvendo a eles o comando do sindicato. Na mesa de negociação, esboça-se um acordo e os metalúrgicos propõem uma trégua.
Devido ao descumprimento do acordo por parte dos empresários, Lula ameaça retomar a greve. Nova rodada de negociações e fecha-se a negociação definitiva. Os metalúrgicos não obtém o aumento desejado, mas a vitória é no campo político. O movimento aglutinou várias forças progressistas, dispersas pela repressão dos anos anteriores. Surgiram novas lideranças. Tais mudanças no quadro político ajudaram a criar um partido novo, dos trabalhadores, de esquerda. O Brasil estava começando a mudar.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Taiguara, vê como o fogo brando funde o ferro duro



"Taiguara, você é um compositor romântico, meu filho. Por que está se metendo com essas coisas? A juventude gosta tanto de você..." Para dona Marina, censora da ditadura militar, era inconcebível que o rapaz, autor de sucessos que falavam do amor, se metesse com a realidade do próprio País.
Nos anos de chumbo, a trajetória de Taiguara passou tanto pela música romântica (Helena, Helena) quanto pela chamada "música de contestação" - "Que as Crianças Cantem Livres" é um exemplo. O resultado desta opção política foi aquele mesmo, aplicado a tantos outros artistas, mais ou menos famosos: a censura e o exílio.
Mas, ao contrário da maioria, Taiguara aprofundou-se nas questões do socialismo. Admirador de Luís Carlos Prestes (compôs O cavaleiro da Esperança), percorreu a África e viveu muito tempo em Cuba. Um dos seus últimos CDs foi gravado lá, com músicos cubanos.
Na volta do exílio, fez muitos shows pelo Brasil. Porém, a mídia já havia fechado as portas para a sua carreira. Faleceu em solo cubano, em 1996, aos 59 anos, vitimado pelo câncer. Até o fim da vida acreditou numa sociedade igualitária. No video que apresento aqui (Especial Taiguara, TV Bandeirantes, 1996), Taiguara nos dá uma pista do caminho a ser percorrido: vê como o fogo brando funde o ferro duro...
Há 8 anos, o fogo brando começou a derreter o ferro duro. Esperamos que, nos próximos quatro anos, a chama permaneça acesa, intensa. Para que, no futuro, a sociedade brasileira seja moldada de acordo com a vontade da maioria.
'Que as Crianças Cantem Livres" poderia ser a trilha sonora para a posse de Dilma. Fica aqui como sugestão.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Gonzaguinha acreditava na vida (é bonita, é bonita, é bonita)



TV Cultura SP, Programa Ensaio, 1990. Um ano antes de falecer em um acidente de automóvel, Gonzaguinha cantou um pout-pourri com três dos seus maiores sucessos, músicas que falam da vida e do Brasil. O programa foi um dos precursores do estilo "Acústico". Relembre Gonzaguinha no violão, acompanhado apenas por percussão.
Sua obra é uma das mais profundas e instigantes da MPB. Engajado politicamente, teve músicas censuradas pelo regime militar. Entrou numa fase mais romântica com "Começaria Tudo Outra Vez". Ajudou a consagrar Maria Bethânia, por exemplo, com Explode Coração". Mas ele jamais deixou de falar diretamente com o povo, por meio de sambas e baiões e outros ritmos populares. " Meu sonho é ver as pessoas assobiarem minhas músicas na rua", dizia.
Após a morte de Gonzagão, caiu na estrada para preservar o trabalho do pai - tornou-se um cavaleiro solitário. Faleceu aos 45 anos numa dessas incursões pelo Brasil.

sábado, 11 de dezembro de 2010

Guga: depois daquele domingo...

   A primeira vez que o vi jogar foi num longínquo domingo de maio de 1997, totalmente por acaso. Buscava algo interessante na programação da tevê aberta para enriquecer o meu tardio café da manhã, por volta das 11 horas. Rodei canais e fui parar na Record, que transmitia a final de um torneio de tênis na França.
Assisti aos últimos games do 3º set tentando identificar quem era o sujeito de camisa amarela, magro, cujos cabelos desgrenhados lembravam um esfregão invertido e em movimento, semelhante aos que atazanaram a vida de Mickey no desenho animado O Aprendiz de Feiticeiro.
   Pois bem: o “Mickey” da vez era Sergi Bruguera, veterano do nobre esporte, ex-campeão de Roland Garros e bem ranqueado, mas de quem nunca mais ouvi falar depois daquele dia. Vencê-lo no principal torneio no saibro acabou sendo o seu cartão de visitas para boa parte dos brasileiros, órfãos de um ídolo do esporte nas manhãs de domingo, desde a morte de Ayrton Senna.
   Até aquele instante, para a grande maioria dos cidadãos, ”Grand Slam” nada mais era do que uma espalhafatosa lambida num sorvetão de chocolate. Depois daquele domingo, o Brasil tomou conhecimento de que um catarinense, muito jovem ainda, “pilotava” como ninguém uma raquete, fosse no saibro, no cimento, na grama ou mesmo no paralelepípedo.
   Os três anos seguintes serviram para consolidá-lo entre os “tops” do planeta. Em 2000, quando se tornou o número 1 do ranking, o Brasil já havia aderido à Gugamania. Raquetes e outros acessórios venderam como água por aqui. Pegadores de bolas viraram professores da noite para o dia, ensinando os simpatizantes do esporte a dar os primeiros voleios. O Gatorade se transformou em bebida da moda nos clubes esportivos. Muitos recém-nascidos foram registrados com o nome de Wilson, já que Head não "pegava" bem. Os casos de doenças na garganta aumentaram, por causa daqueles que tentavam imitar os seus gemidos.
   De tudo o que vi nos seus 13 últimos anos de carreira, guardo na mente confrontos de mexer com os nervos (Max Myrni, no Aberto dos Estados Unidos em 2002), embates épicos (Safin e Kafelnikov em Roland Garros), feitos heróicos (vitórias sobre Sampras e Agassi no Masters Cup de Lisboa), exemplos de superação (o “passeio” que aplicou em Federer já com as dores no quadril), situações inusitadas (a dificuldade para superar um holandês com câimbras na Austrália) e, claro, a prova de que existe ressurreição: de quase moribundo diante de um americano desconhecido passou a acelerar corações no Roland Garros de 2001.
   Há dois anos, acompanhei, emocionado, a sua turnê de despedida em vários circuitos do Brasil e do mundo. Por solidariedade, até pensei em cancelar a assinatura da minha tevê a cabo assim que você tocasse na bolinha pela última vez como profissional. Afinal de contas, o tênis que se praticava naquele momento perdera a graça. Os jogos haviam se transformado numa espécie de luta-livre, onde vence quem for mais forte, mais anabolizado e tiver um monte de consoantes no sobrenome, como Davidenko, Kohlschreiber ou Djokovic. Para se ter uma ideia do nível atual do tênis, o número 1 do mundo, Federer, foi um grande “freguês” seu.
Bem, costumo ir todo ano a Floripa, no verão. Se um dia eu cruzar contigo na praia Brava, vou agradecê-lo pessoalmente por ter reproduzido em quadra os nobres valores que o esporte – sua prática ou apenas a apreciação – é capaz de proporcionar à sociedade.
Sempre foi assim desde os mais remotos tempos da humanidade: caçadas épicas ao mamute nas olimpíadas selvagens, freadas estonteantes nas corridas de bigas ou estocadas decisivas na esgrima medieval dos três mosqueteiros. Até chegar à contemporaneidade: defesas espetaculares dos grandes goleiros, tabelinhas criativas entre atacantes geniais, dribles humilhantes dos mais habilidosos, saltos triplos perfeitos, braçadas singulares, arranques imprevistos, “enterradas” acachapantes e, fundamentalmente, saber vencer e saber perder em qualquer fase da história.
   E se houvesse uma calçada da fama das grandes jogadas, um quarteirão inteiro seria coberto pelas suas deixadinhas, aces e backhands na paralela. Mas, por enquanto, seus golpes ficarão impressos na memória daqueles que tiveram o privilégio de conhecer o maior tenista brasileiro de todos os tempos, e que vão dizer às futuras gerações: eu vi Guga jogar e foi um dos melhores, dentro ou fora das quadras.
   É isso. Fico por aqui. Vá surfar à vontade, tocar o seu violão em algum luau na ilha do Campeche ou gastar todo o dinheiro que ganhou naquilo que te deixar mais feliz. Aquele abraço e “huammmmmm” para você também.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Paixões são defenestradas no melhor filme do ano

Amor que salta aos olhos
Janelas da alma, espelhos do mundo. Pelos olhos, entram imagens e saem mensagens.  Expõem sentimentos. Guardam segredos. Trazem emoção.
Perdão, leitor, leitora, não resisti ao preâmbulo poético para falar da sétima arte. Ou oitava - não sei bem em qual classificação o cinema se encontra atualmente, tamanha a ruindade exposta nas telas na presente década.
E quando encontramos uma obra de arte perdida entre tantas produções descartáveis, um Neymar em meio a tantos pernas-de-pau, não se pode deixar de exercer o ofício da crítica cinematográfica. Nem tanto crítica, diante da minha confessada parcialidade em rasgar elogios a uma película que me prendeu na cadeira do início ao fim e que me deixou sem fôlego por alguns instantes. É assim que acontece diante do cinema de qualidade, não é mesmo?
Voltemos aos olhos. Ou melhor, a “O segredo dos seus olhos”, produção hispano-argentina de 2009, vencedora do Oscar de melhor filme estrangeiro. Bem dirigido por Juan José Campanella, com ótimos atores e um enredo de arrasar corações e mentes. Está disponível nas melhores locadoras do ramo e na internet, para quem sabe dominar o P2P.
Pelas janelas da alma dos personagens principais, paixões são defenestradas. Postas para fora. Por essas mesmas janelas da alma, registradas numa foto antiga, um crime é desvendado. E o que temos são almas aflitas que trafegam do passado ao presente, do presente ao passado, pela estrada da memória, em busca do tempo perdido.
Em resumo, a história é a seguinte: Benjamin Esposito (Ricardo Darín), oficial de justiça de um tribunal penal argentino, aposenta-se e se dedica a contar em livro uma história trágica, ocorrida em 1974. Como membro do Departamento de Justiça, participou da investigação do estupro e assassinato de uma bela jovem, casada com Ricardo Morales (Pablo Rago).
Na época, Benjamin prometeu ao marido da vítima ajudar a encontrar o culpado. Ele contou com a ajuda do alcoolista Pablo Sandoval (Guillermo Francella), colega de trabalho, e com Irene Menéndez Hastings (Soledad Villamil), sua chefe imediata, por quem nutre uma paixão secreta.
Mais não conto. Mas destaco o personagem Pablo Sandoval como o coadjuvante perfeito. Cabe a ele fazer o contraponto do humor. Sua intuição, muitas vezes abastecida a álcool, desvenda um dos grandes mistérios do crime. E mostra até onde vai a sua lealdade ao grande amigo.
Relato também as densas trocas de olhares entre Benjamin e Irene, que contam boa parte do filme. A paixão entre eles, ao longo do tempo, transcorre como duas retas paralelas, que por mais próximas, só irão se encontrar no infinito. Irá o casal contrariar os conceitos da Geometria?
Para finalizar, lavro aqui o meu protesto contra o Oscar 2010.  A principal estatueta deveria seguir para a Argentina, não só para fazer justiça ao melhor filme do ano. Mas também como uma forma de fazer a guerra ao terror (aquilo que estão chamando de "cinema" nos últimos anos).

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O Mundo é um Camarão

Mino Carta

Tentemos melhorar o mundo, se ainda for possível, como está vai muito mal. Assim falou, recentemente, ao abrir um congresso de geriatria, Mario Monicelli, suicida na segunda 29 de novembro, aos 95 anos. Lúcido e saudável até pouco tempo atrás, ao ser alcançado pelo câncer atirou-se pela janela do hospital. Mas a tragédia maior era viver em um mundo cada vez mais estranho.
Monicelli é criador de cinema da mesma estirpe de Vittorio De Sica, Bergman, Jean Renoir, Fellini, John Ford e por aí afora. Participou de um período de ouro puro do cinema mundial, o neorrealismo italiano. Soube entregar-se, porém e também, a evocações oníricas, como Fellini e tantos outros habilitados a estabelecer no set fabulosas atmosferas de sonho.
Mesmo ao seguir esse gênero de impulsos da imaginação, como em L’Armata Brancaleone, Monicelli é um poeta do concreto, e não se deixem enganar se o tom aparentemente é de comédia, digamos, em I Soliti Ignoti, que aqui passou como Rufufu. Comédia, sim, mas da própria vida, com suas desgraças e alegrias, misérias e redenções, e ao mesmo tempo relato de um momento de profunda mudança: no final dos anos 50, os pequenos meliantes fracassados acabam por ganhar emprego na construção civil.
Não se fazem criadores de cinema como antigamente. Há exceções, está claro, os irmãos Coen, por exemplo. É compreensível, contudo, que Monicelli se percebesse deslocado no seu ambiente e fora dele. Não se fazem artistas em geral, escritores, pensadores como antigamente. Representantes variados da inteligência do homem.
Impressionou-me muito, anos atrás, uma visita ao museu romano do Palácio Massimo (sobrenome de uma família principesca). Exibe exemplos da pintura da antiga Roma, de excelente qualidade no primeiro século depois de Cristo. Os afrescadores não somente dominavam o desenho e as cores, mas também a perspectiva. No século seguinte começa a mudança. Para pior. Mais três séculos, perdeu-se tudo, a perspectiva inclusive.
Segundo as datas que a história se incumbe de fixar com precisão exagerada, estávamos no início da Idade Média. Para recuperar a perspectiva, e não me permito aqui a metáfora, será preciso esperar mil anos. No presente momento, este que vivemos, uma serigrafia de Andy Warhol é vendida por dezenas de milhões de dólares. Mas poderia anotar que Paulo Coelho escreve best sellers planetários, ou que o filme Avatar bate recordes de bilheteria e O Gladiador e Titanic ganham o Oscar.
Estamos a dar os primeiros passos de uma época escura, de progressiva decadência? Haverá quem contraponha aos sinais negativos os avanços científicos e tecnológicos, alegação discutível, sobretudo em relação a estes.  Eu me permito ter medo dos computadores, temo que me engulam com sua bocarra e passo ao largo. E que dizer da Wikipédia e que tais, e das centenas de milhões, talvez bilhões de seres humanos já deglutidos? Quanto aos progressos da ciência, quem hoje está em condições de se incomodar se o homem se encaminha a isolar a antimatéria?
Pois é, sejamos concretos, e encaremos então a força avassaladora do dinheiro e da doutrinação diuturna perpetrada por instrumentos da comunicação cada vez mais afiados. E excepcionalmente eficazes na destruição do espírito crítico onde, porventura, sobreviva. Avassaladora, a força, e altamente retrógrada. Nem se fale do desastre do neoliberalismo e de como crescem no mundo todo, em sintonia, pobreza e ignorância. Constatem: até o futebol, nossa empolgação predileta, não é mais aquele.
O Caso WikiLeaks fica à perfeição na moldura. É demonstração irretorquível do ínfimo nível do QI do império, enquanto o mundo se engalfinha no insano confronto entre raças e religiões. Cidadãos como Mario Monicelli, que conhecem seu mister de cor e salteado e sabem de muitas coisas mais, enxergam o ocaso das visões do mundo e da vida cultivadas séculos a fio. Depois da Renascença, do Iluminismo e das revoluções políticas, econômicas e sociais veem a nação terráquea como um camarão, ou um ex-conquistador em retirada.
(Texto extraído da revista CartaCapital)

Jornal Unidade: Sociedade quer Conselho de Comunicação


Edição de dezembro de 2010 do jornal Unidade, do Sindicato dos Jornalistas SP, traz reportagem especial sobre os conselhos de comunicação. Clique na imagem para ler o jornal na íntegra (em pdf).

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Apesar de vocês...

Muitos vivem de títulos. Nós vivemos de Corinthians, apesar de:
- ter um técnico retranqueiro que luta só por empates fora de casa;
- ter vovôs em excesso no time, que não aguentam jogar dois tempos;
- ter uma Diretoria marqueteira demais, que muita vezes tenta esconder a realidade;
- ter negociado Douglas, André Santos, Christian, Elias e Jucilei (provavelmente);
- ter trazido Souza, Tcheco, Yarlei, Danilo, Defederico e outros;
- ter um Ronaldo fora de forma, que joga quando quer e não aceita bem as críticas;
- ter cobrado, ao longo do ano, ingressos a preços exorbitantes, inacessíveis para o povão;
- talvez, ter que aturar Adriano com suas crises existenciais e suas extravagâncias;
- nos fazer acreditar que teremos um estádio, apesar de nem sequer haver projeto.
Com essas ressalvas, agora posso dizer que vivemos de Corinthians. Mas que um título no ano do centenário seria bem vindo...ah, como seria.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Adeus, Monicelli


Cena do filme Quinteto Irreverente (Amici Miei II), de Mario Monicelli, 1982

O cinema está encolhendo. O que eu mais temi ao longo dos últimos anos já aconteceu. Virou simples entretenimento, para arrasar quarteirões. O filme de autor, de quem tinha uma câmera na mão e uma ideia na cabeça, está com os dias contados. Alan Resnais ainda resiste, com Medos Privados em Lugares Públicos. Jean-Luc Godard, Ettore Scola e Bernardo Bertolucci estão vivos e podem dirigir algo a qualquer momento. Podemos incluir Giuseppe Tornatore neste grupo? Sim, podemos.  A Lenda do Pianista do Mar e Cinema Paradiso o credencia a entrar no seleto grupo. Ou melhor, no exército brancaleone do cinema mundial, cuja vaga foi aberta ontem, dia 29 de novembro de 2010, com o suícídio do diretor de cinema Mario Monicelli, aos 95 anos.
Tudo bem, Monicelli não fazia exatamente filmes de arte, expressão que usávamos nos anos 70/80 para diferenciá-los dos "aeroportos" e "infernos na torre" que ocupavam os letreiros de praticamente todos os cinemas de São Paulo. Mas Monicelli fazia um cinema especial. O "Exército", uma crítica escrachada ao fascismo, virou sinônimo das minorias que lutavam contra as imposições da indústria cultural. Ou contra o sindicalismo pelego. Ou contra o neoliberalismo que começou a nascer logo após o fim da ditadura militar.
Entretanto, o item de sua vasta obra que mais me fascina é Quinteto Irreverente. Acho que, ao assisti-lo no cine Belas Artes da rua da Consolação, quebrei o meu recorde de gargalhadas num só filme. Sequência de "Meus Caros Amigos", "Quinteto" é a história de cinco velhos companheiros que novamente se unem para sair "aprontando" pela Itália, como nos tempos de escola.
A sua exibição no Brasil coincidiu com a conclusão do meu curso de jornalismo, período em que eu e mais seis alunos consolidamos uma amizade duradoura que perdura até hoje, apesar dos rumos diferentes que cada um tomou. E posso dizer que durante anos "aprontamos" muito por aí, mas sem chegar ao ponto de estapear a cara dos passageiros de um trem logo que se pôs em movimento, como mostra a cena acima.
A similaridade com o nosso grupo estudantil foi um ingrediente a mais para idolatrar o filme. Daqui a uma semana, tenho encontro marcado com essa turma. O primeiro e, talvez, último do ano. Vou com a certeza de que iremos levantar um brinde a Monicelli. Por aquilo que sua obra representou num momento muito importante das nossas vidas. 

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Nada de novo no front

Marcelo de Jesus/UOL
Tomada de Monte Castelo? Não, invasão do Morro do Alemão

Chamem o Joel Silveira. Chamem o José Hamilton Ribeiro. Há mais uma guerra a cobrir. Com o perdão do trocadilho, mais uma guerra com "alemão" no meio, Joel. Em termos de comparação, uma guerra semelhante à do Vietnã, Hamilton. Fraticida. Uma guerra doméstica, bem pertinho das principais redações da região Sudeste.
É a chance de recuperar a audiência perdida por bobagens como bolinhas de papel na cabeça de presidenciável. É a possibilidade de se voltar a vender mais jornais do que na época do Plano Cruzado, quando se quebravam recordes de tiragem por causa da publicação das tabelas com preços congelados de vários produtos.
É também a tentativa de mostrar à CNN como se faz um bom jornalismo em tempo real durante a cobertura de uma guerra. E, quem sabe, pode ser possível criar uma capa em certa revista semanal de forma a fazer respingar o ataque dos traficantes no novo governo que se inicia. Que tal perto da posse?
Como bem mostrou José Arbex Jr. em seu livro Shownalismo. O título explica muito do que vemos na TV. Mais uma vez, a notícia foi tratada como um grande espetáculo. E como todo grande espetáculo, houve apelo fácil às emoções. Eu juro que li num jornal de São Paulo: "na favela da Grota, os agentes ficaram a menos de cem metros de uma casamata que serviu de abrigo a traficantes". Casamata? Sempre havia uma casamata nos filmes da 2ª guerra que passavam na Sessão da Tarde. Acho que em "O Resgate do Soldado Ryan" também havia muitas casamatas. Duvido que os traficantes soubessem do que se trata.
Faltou falar em campo minado. Em bunker. Mas o Jornal da Globo não se furtou a explicar que os traficantes de uma facção aprenderam táticas de guerrilha com os presos políticos brasileiros...nos anos 70. Se estivessem no Vietnã, na mesma época, os vovôs do tráfico certamente aprenderiam a cavar redes de túneis em todos os morros, onde ficariam escondidos; à noite, saíriam para incendiar veículos e emboscar policiais e soldados do exército. Porém, de alguma forma, a imprensa deu um jeito de culpar a esquerda. Que tal abrir os processos dos camaradas presos em Ilha Grande para saber se há algum indício de que o "aprendizado" foi intencional?
E já se fala em Tropa de Elite 3. Na glorificação do BOPE. Mas não é o mesmo BOPE do Tropa 1? Onde o Capitão Nascimento usou a tortura como método de convencimento e o próprio Batalhão só agiu com vigor em retaliação ao assassinato de um agente, num espírito de corpo de dar medo? Serão nossos heróis daqui em diante, com direito a histórias em quadrinho?
No final das contas, goste-se ou não do governador Sérgio Cabral - e parece que a Globo começou a gostar dele -, ele fez o que tinha que ser feito. O governo federal movimentou tropas e equipamentos como deviam ser movimentados. Presos foram transferidos para presídios de segurança máxima e "advogados-correios" foram presos. A grande maioria dos cariocas ratificou o apoio dado aos reeleitos nas últimas eleições. 
E o jornalismo brasileiro parte em busca do próximo show. Não haverá muito o que falar até a posse de Dilma. Nem imediatamente após. Nesse meio tempo, moradores de rua continuam sendo queimados e assassinados, favelas paulistanas sofrem de combustão espontânea e minorias permanecem como alvos de neonazistas e mafiosos mirins. Meras notícias nos pés das páginas, sem muita repercussão. Afinal, para combater esses crimes, seria necessário invadir o quê: prédios de alto padrão?

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Íntegra da Coletiva de Lula - 24/11


A entrevista coletiva do presidente Lula para blogueiros, realizada hoje pela manhã, foi transmitida ao vivo por este e por vários blogs brasileiros.

A mídia alternativa sobe a rampa

Quarta-feira, dia 24 de novembro de 2010, será um dia histórico para a mídia alternativa, que fincou uma "cabeça de ponte" na internet e participou ativamente da eleição para Presidente da República. Nesta data, às 9 horas, o presidente Lula recebe blogueiros para uma entrevista coletiva, com transmissão ao vivo pelo Blog do Planalto, com participação dos internautas.
As eleições deste ano foram marcadas, por um lado, pela manipulação acintosa da grande mídia brasileira em favor do candidato da oposição. Foi algo jamais visto em períodos eleitorais, mesmo considerando todos os pleitos anteriores, incluindo o de 1989. Do outro lado, na trincheira virtual formada na internet, vários blogueiros e tuiteiros tiveram participação ativa na missão de levar informações verdadeiras ao grande público, responder a atos preconceituosos, derrubar factóides e limpar a sujeira deixada por uma campanha alimentada pelo ódio.
 Eu creio que a vitória de Dilma Roussef no segundo turno se deveu em boa parte à atuação desta mídia alternativa, que esteve ao seu lado em todas as horas. O debate eleitoral na internet trouxe de volta os militantes que tinham deixado as ruas há algum tempo, substituídos pelos cabos eleitorais pagos. Provaram mais uma vez que campanha de qualidade se faz com intensa politização dos agentes envolvidos. E que sirva de lição principalmente a certos setores do PT, que 'optaram" por terceirizar certos serviços.
Em relação ao jornalismo praticado no Brasil, a eleição provou que ele vive por aparelhos. Vimos profissionais de renome envolvidos até o pescoço com o presidenciável tucano. Manipulações rasteiras. Propagandas subliminares. E completo distanciamento de grande parte do eleitorado brasileiro, a julgar pelos resultados finais. Como reação natural à ofensiva da grande imprensa, outra parte do jornalismo também escolheu seus candidatos. Vestiu a camisa de Dilma. Montou seus dossiês. E soube trabalhar bem o outro lado da informação.
Entendo que, nessa contenda, a profissão saiu chamuscada. Enquanto o jornalismo no Brasil continuar a ser tratado apenas como extensão de um grande negócio, sempre haverá perda de credibilidade. Enquanto for dirigida apenas por herdeiros, de pais para filhos, sempre haverá reações à sua regulação. Enquanto não houver maior controle do jornalista sobre o resultado do seu trabalho, a profissão estará cada vez mais deteriorada.
Convém voltarmos à coletiva de Lula aos blogueiros. Há meios de se tentar equilibrar os pesos da balança. De se contrapor ao poder dos jornalões. Muitas decisões passam pelo Governo Federal. Propostas de regulação. Defesa do diploma e da melhoria das diretrizes curriculares para o Jornalismo. Rejeição ao AI5 Digital. E, principalmente, estímulo ao crescimento das mídias alternativas com incentivos fiscais. A inclusão do jornalista no Supersimples seria um grande avanço.
Há na Câmara Federal o Projeto de Lei Complementar nº 591, de autoria do deputado Vignatti (PT/SC) que altera o Supersimples e contempla aquela inclusão, entre outras mudanças. Presidente Lula, apoie esse projeto. Dê-lhe o caráter de urgência. O que vimos nestas eleições, em termos de informação alternativa, não pode ser perdido. Com a aprovação do projeto, poderá ficar para sempre.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Dona Dilma, quem fez isso com meu carro?


A Folha de São Paulo finalmente conseguiu. De tanto insistir, o Supremo Tribunal Militar tornará público o processo movido contra Dilma Roussef na época da ditadura. Mas porque tanto interesse no caso? Vasculhando a internet, achei uma possível resposta na foto acima, de um veículo do jornal semi-destruído.
Quem sabe a Folha queira achar alguma pista para saber quem detonou o seu carro, lá pelos anos 70, usado pelo regime militar para transportar presos para as dependências da OBAN. Talvez tenha a pretensão de pedir ressarcimento aos movimentos de esquerda da época, num Tribunal de Pequenas Causas.
Se não for isso, qual será a real motivação do jornal em bisbilhotar a vida pregressa da nossa presidente durante os anos de chumbo - resgatar a memória dos torturadores?
Como até o bueiro da minha rua sabe, a Folha apoiou o regime militar. Mais recentemente, classificou-o como "ditabranda", algo assim, digamos, bem "maneirinho". Algumas capas de 1964 mostram exatamente aonde estava preso o rabo da Folha: na malditadura, oras!

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O jornalismo do ódio: TV Globo SC

Guarde bem este nome Luis Carlos Prates. Gente desse tipo, com essa mentalidade, é que justifica a necessidade de criar mecanismos para enquadrar a mídia brasileira nos princípios da pluralidade de ideias, contra os preconceitos e a intolerância. Veja como anda o padrão Globo de qualidade em SC (tire as crianças da sala):

A crônica esportiva na marca do pênalti

Para muitos, foi apenas "contato físico".

Ao leitor, deve parecer óbvio que o futebol é um esporte de contato físico, pois não há redes no meio de campo a separar os dois times. Pois essa obviedade gritante se tornou o principal argumento de alguns comentaristas esportivos para defender a tese de que não houve o pênalti na partida entre Corinthians e Cruzeiro, que resultou na vitória do dono da casa.
Justamente por ser um esporte de contato físico, há um conjunto de regras que explicitam as situações em que o lance deve correr normalmente ou deve ser apontado como falta pelo juiz.
Em linhas gerais, pode haver o contato desde que não seja usado para impedir a progressão do atacante que possa resultar em gol. Se não fosse desse jeito, carrinho no pé do adversário seria lance normal. O soco, a gravata e a cabeçada também.
Pois algo assim, tão simples de entender até pelo poste da minha rua, tem sido a grande dificuldade dos nossos comentaristas de futebol, cujo inconformismo com certas marcações dos juízes os leva a analisar alguns lances sob a ótica de uma subjetividade que o conjunto de regras rejeita claramente. E eles vão mais além. Muitas vezes, utilizam como parâmetros a postura de outros árbitros em determinadas partidas. “Falta como essa ninguém marca”. Ou “ninguém marca pênalti faltando três minutos para acabar o jogo”. Ou seja: passam a classificar como exageros as decisões de juízes que aplicam tão bem as regras.
O jogo daquele sábado, dia 13 de novembro de 2010, deixou claras as deficiências da profissão de jornalista. Assisti ao jogo no pay-per-view e fiquei surpreso quando vi vários comentaristas entrarem no clima criado pelo Cruzeiro e demonstrarem indignação com o pênalti marcado. O que está acontecendo - pensei - a imprensa golpista entrou em campo? Fui zapeando entre os canais esportivos da TV a cabo e em algumas emissoras de rádio e constatei a tragédia em que se encontra nossa crônica esportiva.
Ela não chega a ser golpista. É ruindade mesmo. Muitos comentaristas, com anos de janela, desconhecem os detalhes das regras. Alguns vestem a camisa dos seus clubes. Ou até dos seus partidos, se houver alguma vinculação política de determinado time.
Um conhecido comentarista, em viagem pela Bahia, entrou ao vivo na rádio Bandeirantes para protestar contra a marcação do juiz. E, nos dias seguintes, martelou o assunto, estimulando a polêmica para segurar a audiência. Outro jornalista, da ESPN, era o mais exaltado de todos. Mostrou, também ao vivo, toda sua revolta e indignação contra o “pênalti absurdo”. Há anos ele leva adiante uma esquisita campanha contra a marcação de pênaltis. A decisão do árbitro, para este representante da liga antipênalti, logicamente virou um prato cheio. A sua fúria foi registrada também em seu blog e em outras aparições no canal esportivo.
Mas, o mais grave de tudo isso é que tais profissionais se esquecem com frequência de que não estão na mesa de um bar, entre amigos, onde podem dizer o que vier na veneta. Falam ou escrevem para milhares. Para milhões, dependendo do meio. Podem influenciar decisivamente a opinião pública e contribuir para a desqualificação, intencional ou não, das conquistas de determinada agremiação que, a princípio, venceu por seus méritos, caso não se prove o contrário.
Tecer comentários sem se preocupar com a sua repercussão é uma das falhas mais graves do jornalismo brasileiro. Equivale a acusar sem provas. A fazer ilações sem obedecer à lógica. Nesta profissão, não cabe apenas reivindicar o acesso à liberdade de expressão. A atuação do jornalista é bem mais complexa do que tal generalidade. Mais que direitos, há deveres a serem cumpridos, que passam obrigatoriamente pela boa informação. Pela verdade. Pela real apuração dos fatos. E quando se começa a brigar com a notícia ou com o registro da imagem, a credibilidade vai ao fundo do poço.
O pênalti de sábado existiu e foi bem marcado pelo árbitro. Não era para ser polêmico. Deveria haver apenas indignação dos comentaristas pela atitude irresponsável dos dirigentes do Cruzeiro, que optaram por denunciar uma improvável mutreta para encobrir a queda de produção do time na reta final. Pois, depois desse dia, de mais um vexame da mídia brasileira, quem está na marca da cal não é a bola. É a imprensa esportiva. Ou muda e se aperfeiçoa ou vai ser chutada para a bandeirinha de escanteio. Como já aconteceu com o jornalismo político recentemente, escanteado pelas urnas nas últimas eleições.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Comunicação Democrática

Não basta apenas criar conselhos para democratizar a mídia, como vem ocorrendo em vários estados do País. São medidas importantes, mas que, sozinhas, não terão muita eficácia. Outras medidas são necessárias. Restabelecer a exigência do diploma de jornalista é uma delas, acompanhada da melhoria da grade curricular do curso, para dotar o futuro profissional de visão mais profunda sobre a comunicação social.

É preciso também incluir os serviços de jornalismo no Supersimples para expandir a imprensa alternativa. Ampliar o campo profissional e disseminar a segmentação. O Supersimples poderá dar um novo gás ao jornalismo comunitário, principalmente do meio impresso.

É necessário modificar os critérios de concessão das rádios comunitárias. Hoje, é muito restritiva. Muitas das entidades contempladas na última licitação em São Paulo, após uma série de regras draconianas, ainda não obtiveram a autorização do Ministério das Comunicações. Também seria interessante oferecer linhas de crédito para a aquisição de equipamentos.

Por fim, a internet. Antes de tudo, é preciso barrar a aprovação pelo Congresso do chamado AI-5 digital, projeto de lei elaborado pelo senador Eduardo Azeredo (PSDB), que restringe de modo absurdo o uso da internet e das próprias redes sociais. Nesta eleição, os blogs tiveram uma atuação significativa no sentido de restabelecer a verdade e combater as artimanhas da grande imprensa.

As entidades de classe têm que insistir na aprovação do Conselho Federal de Jornalistas, para fiscalizar o exercício da profissão, no sentido de coibir abusos. Com essas medidas, creio que poderemos enfim iniciar o processo de democratização dos meios de comunicação, criando-se alternativas sólidas às ações golpistas de parte da imprensa nacional.