terça-feira, 30 de junho de 2015

Fobias Bem Brasil



A campanha contra a homofobia no feicebuque foi um sucesso, mas teve um importante efeito colateral: a arcoirisfobia. Sabe aquele momento em que o cidadão entra na rede social, se depara com as cores do arco-íris aplicadas em várias fotos de perfil, começa a espumar num canto da boca e sente uma vontade incontrolável de dizer aos amigos que, para apoiar a causa LGBT de verdade tem que dar a bunda?

Pois é. Esse tipo de reação aconteceu aos montes. Também houve um certo patrulhamento àqueles que defendem a causa mas não quiseram trocar a foto do perfil. E existiu um pouco de maniqueísmo, como se os participantes se dividissem entre os "coloridos do bem" versus os "apáticos do mal".

Com vivemos na Era dos Extremismos, acredito que tudo tem que ser bem explicadinho, nos mínimos detalhes, como diria um antigo personagem da Praça da Alegria (fui longe, hein?), para evitar atritos desnecessários e mágoas incuráveis.

É algo relativamente simples de entender: não pode ser chamado de homofóbico quem não quis colorir o seu perfil. Foi um "não ato" legítimo de quem teve os seus motivos. Mas, quem não só não coloriu como chutou a tela do computador ao tomar conhecimento da campanha, aí já é um caso de arcoirisfobia.

Quem coloriu a própria foto o fez em favor de uma cruzada contra a praga da intolerância no País. Contra a homofobia, aquela que agride com lâmpadas fluorescentes; aquela que atropela e mata, passando com o carro por cima do corpo várias vezes; aquela que desfigura com navalha o rosto de quem modelou o corpo de acordo com a sua orientação sexual.

Portanto, a urgência da causa se sobrepôs ao fato de que a campanha no "feice" foi em comemoração à decisão da Suprema Corte americana de legalizar o casamento gay - algo muito significativo, pois os EUA é ultraconservador. Obviamente, uma minoria de feicenautas entrou na onda por modinha, ou por gostar demais dos EUA ou, sei lá, "o aplicativo estava disponível, era de graça, eu usei".

E por falar em fotos de perfil, cabe uma observação bem óbvia e ululante a respeito da individualidade e das preferências pessoais. Colocar no próprio perfil a foto do Pato Donald, do Darth Vader, da cantora Joelma, da Dilma ou de você mostrando a língua para ela tem a ver com a liberdade de escolha e a igualdade de direitos. Pode haver discordância, que deve ser manifestada com respeito.

A regra vale também para postagens e comentários elaborados com um mínimo de educação. E se aplica a quem se deixou fotografar vestido de mulher e adotou o nome de Waldireny Wonderfull. Se a Wal foi com a sua cara e lhe enviou um pedido de amizade, fica ao seu critério incluí-la no círculo de amigos.

Mas, se além de recusar a amizade, você a denunciar ao feicebuque alegando que a imagem fere a moral e os bons costumes, já começa a existir "um certo preconceito", o que não é nada certo. E se, além disso, entrar na página da Wal para ofendê-la, ou escrever "morra, Waldireny" na calçada em frente à casa dela, aí é homofobia no grau máximo da escala Richter.

Aquela velha conversa sobre religião também não cola mais. Afinal, cobiçar a mulher do próximo aparece na Bíblia como pecado. Nem por isso houve redução significativa na quantidade de adultérios.

Outra coisa: se eu defendo a aprovação de uma lei que criminalize a perseguição aos homossexuais, não significa que eu seja gay ou que eu só tenha esta causa para apoiar. Vi muita gente dizer: fulano defende o arco-íris mas não faz nada pelas crianças do Pobrequistão, que morrem de fome. Ora, a cidadania não é um teste de múltipla escolha, onde eu tenho que optar por apenas um item. A não ser que um dos itens seja "todas as anteriores".

Enfim, dou uma dica aos que praticaram a arcoirisfobia, pré-estágio da homofobia: vá se acostumando. A legislação que favorece a união estável homoafetiva no Brasil já está em vigor há algum tempo. Bem anterior à dos EUA. Exceto em alguns países fundamentalistas, a medida já está rodando o mundo e não tem volta. E não adianta sair do feicebuque para deixar de ver as fotos arcoirizadas dos perfis ou evitar cruzar com a Wal em alguma conversa com amigos. Se não mudar o pensamento, o melhor a fazer é sair do planeta.

Se ficar na Terra, ligará a TV e aparecerão personagens de novela se beijando. Assistirá apenas propagandas e topará com uns perfuminhos especiais para o dia dos namorados. De todos os tipos.

Se for aos EUA, especialmente San Francisco, vai presenciar casamentos gays em praças públicas. Descobrirá que até o seu ídolo do futebol já foi flagrado dando selinho em outro macho. E a "cereja do bolo": em janeiro de 2015, o papa Francisco recebeu no Vaticano uma transexual espanhola para uma audiência. Sacou o clima? Se a sua mente continuar fechada, só restará o Estado Islâmico para pedir asilo...

Enquanto processa tais informações, diga-me: e se um dia a sua filha pedir de natal a boneca Barbie Transex com todos os acessórios, o que você vai fazer? Pular da janela? Sequestrar o Papai Noel? Incendiar a Mattel?

Se Tim Maia estivesse vivo, irreverente como era, acredito que ele editaria a famosa música Vale Tudo. Pois, hoje, está valendo tudo mesmo: homem dançar com homem, mulher com mulher, transexual com transexual e todas as combinações possíveis. Se não estiver gostando do baile, basta se retirar. Sem essa de arremessar a jarra de ponche em quem lhe convidou para uma contradança.

Enfim: que cada indivíduo continue sendo o que sempre foi, em termos de orientação sexual; ou vire aquilo que desejava ser, mas tinha medo de ser massacrado. E que muitos revejam os seus conceitos para finalmente dizer a si mesmos: isso, definitivamente, não me incomoda mais.

Vai se sentir mais feliz, com toda a certeza.



No feicebuque brasileiro: após o arco-íris, veio a tempestade

sábado, 20 de junho de 2015

#DevolvamAGraçaDoFutebol



   A arte de inventar uma polêmica e se beneficiar dela. O jogo entre Corinthians x Internacional, realizado no dia 13/06 em Itaquera, num sábado, terminou com a vitória de virada do time da casa: 2 x 1. Após o apito final, por volta das 18 horas, apareceu uma hashtag no placar eletrônico do estádio: #põenodvd.

   Tratava-se de uma provocação aos gaúchos por causa de um episódio de anos atrás, quando o Inter elaborou um DVD para provar que o Timão era favorecido pelas arbitragens. A hashtag tomou conta das redes sociais, sem maiores consequências. Aparentemente, o adversário assimilou a brincadeira e deixou por isso mesmo.

   Porém, cerca de 15 horas depois, num domingo, o UOL estampou a notícia de que o STJD estuda punir o Corinthians por causa da frase, com link para o Blog do Boleiro. Obviamente, não houve expediente no STJD para que alguém pudesse se manifestar sobre a frase do placar. Nem mesmo os dirigentes do Internacional comentaram a brincadeira neste período.

   Mas, provavelmente, Luciano Borges entrou em contato com o procurador do STJD logo após a partida, expôs a situação e arrancou algumas palavras bem evasivas sobre a incitação à violência, cujo corpo da matéria desmente o título. Afinal, como o procurador reconheceu, não houve violência.

   O que não importa muito, pois o jornalista atingiu os seus objetivos: polemizou a respeito de uma simples brincadeira e obteve os valiosos cliques em sua página.

   Como temos pessoas públicas neste País que estão sempre em busca de holofotes, o assunto poderia ter dado pano pra manga graças ao alerta do blogueiro para uma simples brincadeira. Sempre lembrando que o futebol está cada vez mais parecido com um imenso quartel, onde estão proibidos rojões, sinalizadores, bandeiras, bebidas alcoólicas, pau de selfie e outros objetos que, na interpretação da polícia militar, seriam usados como armas.

   Por enquanto entrar nas arenas portando as próprias mãos está liberado.

   Já as falas do presidente do Timão, Roberto de Andrade, e do técnico Tite se encaixam no quesito "ridículos". Em vez de defenderem a brincadeira, que não utilizou nenhum tipo de preconceito, posicionaram-se contrários à frase. É óbvio que os clubes precisam ficar alertas, pois o STJD, na esteira do processo de judicialização do País, costuma ser severo com comportamento dos torcedores, punindo os clubes com a perda de pontos, perda de mando de jogo e jogos com portões fechados.

   Entretanto, houve evidente exagero nas precauções. Tite, indignado, alegou falta de respeito ao adversário, opinando sobre algo que não faz parte das suas atribuições como técnico de futebol.

   O mico não parou por aí. Na segunda-feira, o presidente corinthiano pediu a demissão do autor da frase à empresa que administra o placar. O assunto, que iria morrer naturalmente, voltou à baila.

   E, nas redes sociais, surgiu o protesto da torcida com a hashtag #DevolveOempregodoMaluco!

   A Diretoria voltou atrás.

   Leia aqui a matéria do blogueiro.

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Jornalismo kamikaze

Manipulação tosca no título de uma matéria do Estadão, publicada hoje, referente à idade dos infratores em delitos no estado de SP. A frase omite que os atos infracionais analisados pelo Ministério Público são aqueles cometidos apenas entre adolescentes, como mostra o corpo da matéria em seu primeiro parágrafo. Algo, aliás, muito óbvio. Seria espantoso se bebês com cinco ou seis meses liderassem as infrações entre os menores.

E, pior, o leitor é tratado como um imbecil, na esperança de que ele não vá além do título e adira à redução da maioridade, causa que o jornal defende. Apelações desse tipo são sintomas de que o jornal respira por aparelhos. Está perto do fim da linha.

Isso me lembra muito o desespero dos japoneses na segunda guerra mundial, retratado no filme O Império do sol, de Spielberg. Na última fase da guerra, crianças e adolescentes passaram a atuar como kamikazes, na inútil tentativa de reverter um quadro praticamente consolidado.

Também me vem à cabeça A Queda, de Oliver Hirschbiegel, que retrata as últimas horas de Hitler em seu bunker, junto aos assessores mais próximos.

Aliás, este filme é a base para divertidos vídeos nos quais a tradução dos diálogos abordam situações da política brasileira. Seria interessante editar um desses como se fosse uma redação da velha mídia, perto do fim.

Manipulação tosca. O jornal quer que você leia apenas o título da matéria

quinta-feira, 11 de junho de 2015

CRUZES!



   A maior crucificação da história aconteceu em Roma, ano 71 ac. Seis mil escravos morreram na cruz. Entre eles, Spartacus, um dos líderes de um movimento que ousou enfrentar o poderoso exército romano.

   A crucificação era o método usado no passado para eliminar pessoas que se rebelavam contra o regime, aquelas que não combinavam com a moral e os costumes da época ou quem pregava ideias contrárias ao pensamento vigente, como Jesus Cristo.

   Só recebia este tipo de condenação quem não pertencia à sociedade romana, formada pelos chamados "homens de bem (ou bens)".

   Com o passar do tempo, a crucificação caiu em desuso.

   Mas assumiu a conotação de perseguição implacável a alguém ou a grupos específicos.
   Mais ou menos o que certos evangélicos fazem cotidianamente com os gays, ou que parte da sociedade está fazendo hoje com a artista que "ousou" encenar a sua crucificação na parada GLBT, pedindo que se dê um basta na homofobia.

   Com seu gesto, ela deu um ar de seriedade e politização a um evento que caminha para se tornar apenas um carnaval fora de época, cujos organizadores cobram taxas ilegais de outras entidades que queiram participar.

   Na linguagem popular, pegaram Viviany Beleboni para "Cristo" (uma expressão muito comum no passado). Por enquanto, apenas no sentido figurado, o que já é abominável!

   Ela que se cuide e que a sociedade progressista do País a proteja, pois os nossos calígulas andam com muita sede de vingança e poder. Até nomearam cavalos para o legislativo, vejam só...

Foto: Victor Moryiama - G1 São Paulo