terça-feira, 27 de dezembro de 2011

A nave prefixo 2012

Prezados passageiros, a viagem está prestes a recomeçar. Não é preciso apertar os cintos ou reclinar os bancos - a menos que queiram, é óbvio. Também é dispensável gravar mentalmente as saídas de emergência, pois só existem em teoria.
O que seguem são apenas recomendações. Prá começo de conversa, mantenham-se acordados, pois o início do passeio costuma ser apoteótico! O espoucar dos fogos de artifício deixa o céu todo iluminado, coisa mais linda, podemos acompanhar a trajetória das rolhas de plástico das “champanhes” de sidra, abertas por grande parte de vocês para dar sorte em todo o tempo de trajeto.
Se possível, usem roupas brancas, símbolos da paz. Gastrônomos sugerem comer lentilhas. Umbandistas, pular sete ondas. Supersticiosos não ficam relaxados enquanto não assistir ao show do Roberto Carlos na Rede Globo de Televisão.
Pedimos desculpas antecipadas pelos possíveis – e derradeiros - solavancos do prefixo número 2011. Sabem como é, o espaço sideral já não é o mesmo desde que alguns deuses se transformaram em astronautas; a coisa ficou mais feia quando alguns astronautas viraram deuses e atulharam o espaço de quinquilharias cibernéticas, espalhadas pelo trajeto.
Sempre contamos a história da nave de prefixo 2004, para mostrar que nem tudo são flores ao longo do caminho: um dia depois do natal daquele mesmo ano, ela terminava sua viagem de forma rotineira, até que derrapou num satélite-espião, abandonado às pressas após o fim da guerra fria. A fumaça em excesso e os vapores estranhos emanados pela casa das máquinas atrapalharam a visão dos pilotos, e ficou impossível navegar por instrumentos. O sacolejo foi tão forte que chegou a deslocar algumas placas tectônicas.
Resultado: houve avarias num dos compartimentos, chamado Tailândia, que foi inundado por ondas gigantes, causando incontáveis baixas entre passageiros e tripulantes.
Mas fiquem tranquilos. Mais que isso: esperançosos. Esta companhia adotou um programa de gestão ambiental em seus procedimentos internos, procurando aumentar a segurança dos usuários com vistas a um futuro mais promissor. E, por via das dúvidas, espalhou galhinhos de arruda e fitinhas do Bonfim em todos os cantos do globo.
Há algumas décadas, mesmo sendo a única empresa do universo especializada em circunavegação ao redor do Sol, a “Planeta Terra Empreendimentos Espaciais” tem procurado fazer a sua lição de casa em relação à rotina interna - apesar dos ianques, que insistem em tomar conta do combustível; e dos chineses, que monopolizam o varejo na maioria dos compartimentos.
Mesmo assim, aguardamos com otimismo o dia em que receberemos a tão sonhada certificação ambiental ISO 14.000, acompanhada de uma graninha em dólar, paga pelo protocolo de Kyoto, proveniente da aprovação de projetos para reduzir as emissões de gás carbônico no ar.
Reconhecemos que temos problemas aparentemente insolúveis no interior da nave. Comida boa não é para todos, só para os que estão na primeira classe. Não há bancos reclináveis para a maioria. Muitos navegam sem cintos de segurança ou capacetes. Sofrem com epidemias variadas.
Em alguns lugares, mal chega o vento fresco, que dirá o ar condicionado. Tem sempre aquela “autoridade” que pega o trem andando e senta direto na janelinha. Sem falar dos que sonham implantar pedágios ao longo da “astrovia”, sob pretexto de que apenas a iniciativa privada sabe administrar bem o vácuo total.
Agora que entramos na reta final, que dá acesso aos boxes para novo abastecimento e troca de pneus, lembramos que, no ano que vem, acontecerá, para esta geração, a última sequência em que dias, meses e anos possuem o mesmo número, iniciada em 01/01/01. Vejam a coincidência: 12/12/12 cairá numa “quarta-feira”, palavra grafada com 12 caracteres, se contar o hífen (as aspas não, por favor!).
E mais: “dois mil e doze” tem doze letras, excluindo-se obviamente os espaços em branco (“dois mil e treze” tem treze letras, mas isso é outra história).
E sabem o que tudo isso significa? Hein? Rigorosamente...nada. Ou: todo o vácuo que nos separa do sol. “Planeta Terra” não acabará tão facilmente, pois é muito sólida no mercado. E, de mais a mais, a troca de prefixo é apenas uma convenção, uma demarcação necessária para tornar a vida mais organizada enquanto sociedade.
Conta muito o que aprendemos em geografia. A Terra gira em torno do sol numa velocidade estonteante, mas leva 365 dias e 6 horas para completar o percurso. Doze meses. Um ano. Às vezes bissexto, como em 2012. Trata-se de um verdadeiro carrossel ininterrupto, com a vantagem de também girar sobre o próprio eixo, para dar mais emoção (mas o ingresso é sempre cobrado, de alguma forma).
Só que esta mesma convenção, chamada de virada do ano novo, é a graça da vida. Um marco, um ponto de chegadas e partidas, uma data para fechar balanços e iniciar projetos. Programar-se para as quatro estações. Estabelecer resoluções. Portanto, sugerimos adotar as nossas recomendações, entrar no clima, encarar o futuro com muito otimismo e comemorar com o que puder – até com Sidra Cereser, com o perdão pela rima pobre. Enfim...
Feliz 2012 e boa translação para todos.
A nave vai zarpar...uhu!

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O fígado (em três partes)

O fígado - parte I

Passei dias à espera de um bom gancho para poder comentar algo sobre a construção da Usina de Belo Monte. Ou melhor, sobre o vídeo de celebridades globais engajadas na luta contra a instalação de uma hidrelétrica no Alto Xingu, parte de uma campanha maior do Movimento Gota D’água.
Entenda, o fígado trabalhou muito durante todo o mês de novembro. Absorveu com dificuldade o absurdo movimento de oposicionistas nas redes sociais para tentar levar Lula a um tratamento no SUS, motivados – vejam só o nível da crueldade – por um câncer na laringe do ex-presidente.
Resistiu bravamente ao chamamento à violência praticado pela mesma tropa virtual, engrossada por estudantes de nível superior da rede de ensino particular e professores universitários contra os estudantes da USP, por ocasião da evacuação da Reitoria.
E quando surgiu o vídeo global, ele (o fígado) me pediu a caneta emprestada, pronto para cometer desaforos em mal-traçadas linhas, que, de imediato, me daria o trabalho de digitá-las. “Bando de Solineuzas”, ouvi do fundo do meu âmago, em referência ao papel que consagrou a atriz Dira Paes na série “A Diarista”.
Solineuza, vocês devem lembrar, era aquela moça ingênua, iletrada, cuja graça era a dificuldade de entender obviedades gritantes. E Dira não só fez parte do coro contra Belo Monte como deu entrevistas desqualificando a ampliação da oferta de energia elétrica: “é preciso melhorar a saúde e a educação, e não fazer hidrelétricas”, afirmou.
Tocado por estas palavras, o órgão vital fez chegar aos meus ouvidos um de seus comentários...ácidos: pois é, fazer cinema de qualidade duvidosa com financiamento público pode, né? Quantas creches não seriam construídas com esse dinheiro!
Portanto, como vocês podem observar, escrever com o fígado é algo que se deve evitar sempre, assim como beber em demasia ou ficar conectado demais nas redes sociais. Recomendo cautela em todos os casos.

O fígado – parte II

Talvez inspirado pela conquista do Campeonato Brasileiro pelo meu clube do coração, pensei em várias máximas do futebol para rebater, por analogia, os argumentos pretensamente ecológicos utilizados por uma parte do elenco da Rede Globo num vídeo que se propõe a parar a construção da usina de Belo Monte.
Bastaram alguns acontecimentos novos neste Brasil querido e - pimba! - veio a frase: treino é treino, jogo é jogo. Expressão aparentemente banal, mas que pode ser exemplo para mostrar o tanto de distância que há entre a ficção e a realidade. Ou entre o rascunho e o texto publicado. Ou a roupa apenas alinhavada e aquela costurada definitivamente.
Pois bem. Enquanto o elenco global treinava a sua cidadania no vídeo contra a hidrelétrica; rascunhava sua ideologia; alinhavava todos os argumentos em favor das comunidades indígenas e da preservação da fauna e da flora da região Norte, o jogo começava de verdade em outros cantos do País.
Um jogo bruto, em campos do Mato Grosso do Sul, praticado por jagunços na disputa por terras ocupadas pelos índios guaranis kaiowás. Ataques traiçoeiros, mortes a sangue frio e muitas ameaças aos sobreviventes da chacina.
Quilômetros à frente, outra pincelada de realidade: o jogo sujo, do vazamento de petróleo na bacia de Campos praticado pela Chevron, que conseguiu esconder o fato por cerca de dez dias. A mancha esteve (ou está) perto de chegar a praias do litoral carioca e paulista.
O vídeoshow fala da ameaça de extinção dos índios. Dos riscos a um santuário ambiental. E, a respeito daquilo que pode ser a solução para os males da escassez de energia, nossos rebeldes sem causa (e sem sutiã) pintam um quadro mais que tenebroso, envolto em perigos que não só não existem, como estão impedidos de acontecer por força de decretos e regulamentações. Usam apenas tintas de meio-tons e meias-verdades.
Como dizia o agente Mulder da série Arquivo X, a verdade está lá fora. Longe, bem longe do mundo encantado dos nossos globais e do paraíso ecológico dos ecochucros, que não enxergam um centímetro além do caule de uma planta.
Meu fígado ainda aguarda esperançoso algum vídeo mais contundente, com atores da Globo, que não seja o tradicional clipe de natal e ano novo. Talvez, com Juliana Paes falando tupi e arrancando um colete a prova de balas enquanto espera uma solução definitiva a favor dos índios no acampamento Tekoha Guaiviry, no município de Amambaí, Mato Grosso do Sul.
Ou então Maitê Proença, vestida de pequena sereia, agitando as barbatanas sujas de petróleo, dizendo que vai pesquisar mais sobre as agressões ambientais praticadas pela Chevron em vários lugares do mundo.

O fígado parte - III

Dois tsunamis. Um que começou o ano, outro para terminá-lo. O primeiro, bem real, do outro lado do mundo. O segundo, metafórico, por estas bandas. Mas afinal, o leitor se perguntará: qual a relação entre ambos?
Explico: no Japão, além de fazer milhares de vítimas, as “águas de março” não só inutilizaram uma usina nuclear como fizeram renascer os riscos que essa matriz energética oferece quando entra em colapso. “Nosso reino por um rio caudaloso”, devem ter bradado cientistas japoneses diante da catástrofe, cientes de que a natureza foi pouco generosa com o império do sol, em se tratando de hidrografia.
No Brasil, foi justamente um rio caudaloso que provocou um tsunami de meias-verdades. Todas já rebatidas com eficiência técnica, por ocasião do uso do Xingu como fonte de energia elétrica, consagrando a nossa principal matriz energética.
O que seria algo para causar inveja em países que dependem da fissão nuclear e da queima de carvão para produzir energia, a construção de hidrelétricas passou por questionamentos ambientais e sociais, colocando num mesmo vídeo, nas palavras de celebridades globais, a preocupação com territórios indígenas, expulsão de ribeirinhos, modificação da flora e devastação da fauna.
Argumentos ditos sem a profundidade necessária, que acabaram se transformando num “samba do ecologista doido”, onde o importante é a rima, mais que o conteúdo da canção.
Ora bolas. Afinal de contas, os ribeirinhos sairão das suas palafitas e receberão casas de alvenaria. Terão investimentos em infra-estrutura, também ao alcance dos índios, que não perderão um centímetro de terra. O lago a ser formado terá dimensão ínfima, praticamente a mesma área alagada em época de cheias.
O meio-ambiente não sofrerá agressão significativa. Talvez turbinas, casas de máquinas e barragens destoem um pouco da paisagem. E só. O bloco de energia produzida será imenso e renovável, impensável para eólicas ou solares. Custo baixo dos megawatts gerados. Cerca de 70% comprometidos com os lares brasileiros, sobrando pouco para a indústria pesada, eletro-intensiva.
O mais importante de tudo é que o rol de exigências está sacramentado em edital. Sob os olhares severos da opinião pública. Da mídia. Dos três poderes. Dos ribeirinhos e dos indígenas. Dos artistas da Rede Globo.
Pois, se não houver certos controles, aí sim, pode haver devastação. Há exemplos em muitas margens de rios, à beira de muitos reservatórios. Aqui em São Paulo, região metropolitana, bem do ladinho de milhares de casas, o Tietê e seus afluentes como fonte energética são os maiores exemplos de como a engenhosidade humana, aliada à ganância, podem comprometer irremediavelmente o meio-ambiente.
Maus exemplos, sem dúvida. Há mais de cem anos, um grupo de canadenses resolveu investir no Brasil, no ramo de serviços públicos. Foi fundada a Light, que passou a produzir e vender energia elétrica numa época em que não existiam ONGs e relatórios de impactos ambientais. Apenas capitalismo selvagem. De início, ela operou com a queima de carvão na região da Luz. Depois, com o Tietê já retificado, construiu a primeira usina nas proximidades de Santana de Parnaíba.
Mas o grande lance de engenharia viria anos depois. O Rio Pinheiros, afluente do Tietê também foi retificado. Mais do que isso, teve o fluxo de água invertido. Em vez de correr para o rio maior, tomou a direção da serra do Mar, graças a usinas elevatórias e poderoso bombeamento.
Boa parte da região sul da capital foi alagada, formando uma enorme represa: Billings, em homenagem a um dos mentores da obra. No alto da Serra, a água represada iniciava a “viagem” por adutoras até o nível do mar. Já em Cubatão, a força mecânica da queda d’água fazia girar as turbinas da Usina Henry Borden, produzindo energia em alta escala, transmitida para a CSN, siderúrgica instalada em Volta Redonda (o polvo canadense também operava no Rio de Janeiro).
Genial, não acham? Mas o que sobrou de tudo isso? Uma herança maldita. Atualmente, a Usina Henry Borden quase não gera energia, pois o bombeamento do Pinheiros para a Billings está proibido, enquanto ainda houver poluição em suas águas. Este rio hoje é um esgoto a céu aberto, um canal, que faz do entorno uma área sujeita a alagamentos. Como também o Tietê, apesar das comportas instaladas na altura de Osasco para fazer o controle de cheias. A EMAE, uma empresa originada a partir da antiga Light, existe praticamente apenas para controlar o volume de água que corre na antiga estrutura, em época de chuvas intensas.
Enfim, é uma história que merece ser contada com mais detalhes, noutra ocasião. Talvez em documentário, com depoimentos sérios, sem frases tolas. Certamente não seria impedimento para a construção de Belo Monte ou Girau, mas ficaria como informação para a sociedade.
Como sabemos, editais e outros documentos podem sempre ser modificados, sob um argumento qualquer. O que vale para determinada época, pode não valer para outras. E, nessas horas, deveríamos ser mais escoteiros e menos artistas. E ficar sempre alertas.


domingo, 4 de dezembro de 2011

Nem tudo que reluz

E de repente, em pleno dia de decisão, a gente volta a ser Corinthians do jeito que sempre foi. Ganhar um título é importante, mas passa a ser irrelevante diante do falecimento do Doutor Sócrates, genial pensador, revelado pela Nação alvinegra. Isso sim é perder irremediavelmente, sofrer uma derrota sem ter a possibilidade de dar o troco no jogo de returno.
Mas também é ganhar, pois voltamos à nossa prazerosa realidade: mais importante do que levantar a taça é escrever mais um capítulo da história, imortalizar nossos feitos, tendo como protagonista alguém que ajudou a trazer a liberdade de volta, dentro e fora dos campos.
Nos estertores da vida, marcaste um gol de calcanhar, companheiro. E merece o aplauso de todas as torcidas do Brasil. O triste momento nos oferece uma reflexão sobre os valores da vida, sobre a busca incessante por coisas que reluzem numa sala de troféus, sem nos iluminar por dentro.
Ganhando ou perdendo hoje, o título já é nosso. Vamos às ruas comemorar. Vai, Corinthians!

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Nelson Rodrigues, 1976: O Rio é uma cidade ocupada...

“Invasão Corinthiana”

Nelson Rodrigues

Uma coisa é certa: não se improvisa uma vitória. Vocês entendem? Uma vitória tem que ser o lento trabalho das gerações. Até que, lá um dia, acontece a grande vitória. Ainda digo mais: já estava escrito há seis mil anos, que em um certo domingo, de 1976, teríamos um empate. Sim, quarenta dias antes do Paraíso estava decidida a batalha entre o Fluminense e o Corinthians.
Ninguém sabia, ninguém desconfiava. O jogo começou na véspera, quando a Fiel explodiu na cidade. Durante toda a madrugada, os fanáticos do timão faziam uma festa no Leme, em Copacabana, Leblon, Ipanema. E as bandeiras do Corinthians ventavam em procela. Ali, chegavam os corintianos, aos borbotões. Ônibus, aviação, carros particulares, táxis, a pé, a bicicleta.
A coisa era terrível. Nunca uma torcida invadiu outro estado, com tamanha euforia. Um turista que por aqui passasse, havia de anotar no seu caderninho: "O Rio é uma cidade ocupada". Os corintianos passavam a toda hora e em toda parte...
Dizem os idiotas da objetividade que torcida não ganha jogo. Pois ganha. Na véspera da partida, a Fiel estava fazendo força em favor do seu time. Durmo tarde e tive ocasião de testemunhar a vigília da Fiel.
Um amigo me perguntou: "E se o Corinthians perder?" O Fluminense era mais time. Portanto, estavam certos, e maravilhosamente certos os corintianos, quando faziam um prévio carnaval.
Esse carnaval não parou. De manhã, acordei num clima paulista. Nas ruas, as pessoas não entendiam e até se assustavam. Expliquei tudo a uma senhora, gorda e patusca. Expliquei-lhe que o Tricolor era no final do Brasileiro, o único carioca.
Não cabe aqui falar em técnico. O que influiu e decidiu o jogo foi a torcida. A torcida empurrou o time para o empate.
A torcida não parou de incitar. Vocês percebem? Houve um momento em que me senti estrangeiro na doce terra carioca.

NELSON RODRIGUES era fluminense e publicou este texto no GLOBO em 6/12/1976, dia seguinte ao Fluminense x Corinthians.




Há 35 anos, de 70 a 80 mil torcedores do Corinthians tomaram o rumo do Rio de Janeiro para assistir à semifinal do Campeonato Brasileiro de 1976. Estavam movidos por uma paixão. E essa massa de torcedores, em pleno Maracanã, ajudou a levar o time a uma sofrida vitória nos pênaltis contra um adversário que tinha o apelido de A Máquina, devido à quantidade de craques no elenco. Era o dia 5 de dezembro. Esse episódio ficou conhecido como a Invasão Corinthiana. Foi um dos maiores deslocamentos humanos da história, em tempos de paz.
Eu não fui ao Rio de Janeiro. Mas, no dia seguinte, por volta do meio-dia, parado no ponto da Praça Marechal Deodoro à espera do Penha-Lapa, vi ao longe o avançar de uma passeata. Reconheci as bandeiras. Era a torcida que havia retornado da viagem. Juntei-me ao grupo, segui o povo e não parei mais. O Corinthians já havia invadido o meu coração.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Cadê a goleada que estava aqui? O UOL comeu...

Muito estranha a Estatística do UOL sobre o Campeonato Brasileiro de 2011. Confesso que, ao longo do torneio, não prestei muita atenção na quantidade de passes errados do meu clube do coração, nem qual foi a perna mais usada para fazer gols. Ou qual é o lado da narina preferido pelos alas brasileiros para ter mais fôlego nas descidas ao ataque. 
Mas, de certas goleadas, eu lembro, sim. Como aquela, no 1º turno, quando o Corinthians bateu o São Paulo por 5 a 0. Para o UOL, a maior goleada pertence ao Palmeiras, pelo mesmíssimo placar.
Por que um jogo entra na estatística e o outro não, quando ambos deveriam aparecer? Ou o UOL quer refazer a história dos clássicos entre o Timão e o Soberano, ou, para eles, o grau de dificuldade para golear o Avaí é bem maior...

sábado, 26 de novembro de 2011

Belo Monte: vídeo por vídeo, prefiro estes...

A construção da Usina de Belo Monte está sendo o destaque das redes sociais por conta de um vídeo com celebridades da Rede Globo, que pede a paralisação das obras da hidrelétrica para evitar um suposto "desastre ambiental" na região do Alto Xingu.
Em contraposição às meias-verdades ditas pelo corpo artístico da emissora, apresento aqui vídeos que representam muito do que penso a respeito, tanto do ponto de vista técnico sobre a necessidade da obra, quanto aos aspectos mais pitorescos sobre o belo monte de bobagens dito com com qualidade profissional.



Na ponta do lápis: os globais decoraram o texto mas não entenderam patavina do que falaram. O vídeo é um pouco maçante para leigos, mas, se você quer conteúdo, tem que ler e assistir de tudo.



Um dos melhores humorísticos da atualidade, o Furo MTV tira um sarro legal das celebridades.



Plágio descarado: a "fonte de inspiração" para os artistas brasileiros foi um vídeo de celebridades americanas pedindo votos para Obama, em 2008.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Eu e meus botões

Eu, cá com os botões do meu colete a prova de balas, discuto se é jornalismo acompanhar policiais na caça a traficantes nos morros do Rio de Janeiro, ou em qualquer morro do Brasil. Sim, argumento, se há uma pauta como essa, destinada a mostrar a eficiência da polícia em suas incursões na senda do crime, é, sim, jornalismo. Mesmo que a reportagem tenha um ângulo de abordagem diferente disso, continua sendo jornalismo.
Digo: “há, claro, a evidente possibilidade de edições sensacionalistas alavancarem a audiência da TV, elevarem o índice de aprovação do governo estadual e, se a sorte ajudar, captarem algo diferente do normal, como a rendição dos traficantes ou uma execução sumária. Aí, será prêmio de reportagem na certa”.
Mas, quais são as chances reais de ocorrer fatos inusitados numa ação que se transformou em rotina no Rio de Janeiro, rebatem os botões. “Tão corriqueira que a cobertura jornalística das ações policiais sempre acontecia num clima descontraído, como apontou o noticiário de hoje”, complementam.
“Porque então não usar imagens de arquivo? É tudo sempre tão igual”, questiona um zíper, costurado na altura do peito. Evidentemente, o colete como um todo tenta se defender das acusações de fragilidade no episódio que resultou na morte do jornalista Gelson Domingos, alvejado por um tiro de fuzil, numa troca de tiros entre a polícia e uma facção na favela de Antares.
Pela manhã, uma emissora paulista escancarou o problema ao colocar a eficácia do objeto de proteção em debate. No final da tarde, o sindicato da categoria apontou que o modelo utilizado não era apropriado para absorver tiros de fuzil. Poderá ser aberta uma sindicância para se descobrir porque o colete não atuou na hora mais necessária. Setores da oposição pensam em convocar o Inmetro, órgão do governo federal, para dar explicações ao Senado sobre os seus métodos de trabalho. Polícia e TV Bandeirantes se eximem de toda e qualquer responsabilidade com o ocorrido.
“Não somos do ramo de comunicação”, continuam os botões. “Nosso negócio é salvar vidas, independentemente de quem nos vista, mas achamos que isso não é 'bem" jornalismo, não. É...shownalismo. Isso mesmo, shownalismo.  Nada que não tenha sido visto antes, mas que assume ares de novidade quando é transmitido em horário nobre, numa espécie de reality-show. Em vez dos Bebebês, os Upepês”.
Pondero que nós jornalistas, temos papel relevante na sociedade: mantê-la bem informada, com isenção e qualidade, colaborando para a sua transformação. Como bons profissionais, cumprimos obrigações contratuais ao aceitarmos reportagens como essas, mesmo que possam contrariar nossas consciências.
“Vendem sua força de trabalho, mas não controlam o resultado disso”, afirmou um velcro que parecia alheio à discussão. “O fato é que a reportagem frustrada rendeu inesperada audiência, bem superior à que alcançaria se houvesse êxito na ação. Afinal, as últimas imagens de Gelson, no momento de sua morte, estão nos portais da internet do mundo inteiro, nas tevês de todo o País, levando aos espectadores o vício por cenas cada vez mais mórbidas”.
“Uma coisa é cobrir guerras, golpes e revoluções, que por mais violentos que sejam, estão sujeitos a tratados internacionais para preservar a vida dos jornalistas. Outra coisa é a mídia tentar transformar uma simples perseguição a traficantes numa batalha épica, por questões meramente mercadológicas. Nós temos que repensar a estrutura dos próximos coletes a prova de balas, mas vocês têm que repensar o futuro da profissão”, disparou.
Bem, já não há mais tempo para prolongar a conversa, avisa-me uma microcâmera instalada em minha sobrancelha esquerda. Visto o colete (sob seus protestos), guardo no bolso mais alguns apetrechos tecnológicos e parto para outra missão. Desta vez, fui escalado para desvendar as denúncias de abusos sexuais a menores em bailes “funk” no Complexo do Alemão. O tema é bastante familiar, mas tentarei descobrir algo inusitado. Vamos ver no que vai dar.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Pacatos e incautos

Quem faz bolo sabe que, ao menor descuido, ele pode “embatumar”. Se exagerar na batida da massa, desanda. Se passar do ponto na hora de assar, queima. Abrir o forno para dar uma espiadinha pode ser fatal. Ou seja, há limites a serem obedecidos para que o bolo caia no agrado dos que irão comê-lo.
Eu não sou confeiteiro. Não sou apreciador de bolos, principalmente aqueles que ora estão muito doces, ora pouco recheados. Sou um ser político. Como todos. Como os que trabalham na confeitaria. Como os que se postam próximos ao balcão: de um lado, clientes; do outro, atendentes.
Feitas as apresentações, vou agora ao que me interessa – um pouco além de um simples comentário sobre culinária. Não muito longe, pois pretendo falar sobre limites. Os limites do bom senso. Os limites da razoabilidade. Ou daquela tênue linha que, se rompida, pode acionar toda uma engrenagem escondida atrás de uma grande pedra, como nos desenhos animados, estilo “gato e rato”. Bum!
A doença do ex-presidente Lula, ou a reação dos que se julgam seus inimigos, esgarçou a corda tecida com muito esforço a partir da redemocratização do País. Por pouco não houve invasão à fronteira do irracional, habitada pelos mais obscuros sentimentos embutidos na alma do ser. Quando afloram, cegam. Quando vêm à tona, levam à surdez.
A história nos mostra bem isso. O nazismo, o fascismo e outros “ismos” são exemplos. Nossos anos de chumbo ainda latejam. Os torturadores. Os delatores. Os financiadores da tortura. Não fosse pelo chamamento na defesa da pátria - como estratégia de luta - seriam “pacatos cidadãos, da civilização,” como canta o Skank.
Pois de seres pacatos o inferno está cheio, em companhia dos incautos. No Brasil, pacatos e incautos ainda carregam bandeiras - que não são as suas - como estratégia de luta da elite, não mais para buscar subversivos embaixo das camas, mas nas disputas eleitorais das mais tacanhas, como a de 2010. Lembremos: um bolo indigesto feito a partir de ingredientes como aborto, bolinha de papel, bispos retrógrados e muito preconceito.
Tudo regado a ódio extra-virgem, de melhor qualidade, imune à biodegradação que o resultado das urnas deveria trazer. Nas redes sociais, ainda encontramos pedidos para afogar nordestinos; nas avenidas paulistas, lâmpadas fluorescentes continuam pairando sobre as cabeças de homossexuais. Tivemos recentemente a ojeriza à "gente diferenciada" que poderia invadir o bairro paulistano de Higienópolis, caso fosse instalada ali uma estação do Metrô. E agora, agoríssimo, presenciamos o escárnio de parcelas da classe média diante da doença grave do ex-presidente.
Para se ter noção exata da selvageria, a recomendação a Lula para entrar na fila do SUS foi a mais leve, perto de outras, bem sórdidas, que deveriam se tornar impublicáveis fosse o Brasil um pouco mais severo nos casos de mau uso das liberdades que temos para nos expressar (e que custou tão caro a tanta gente!).
Foram tantas, que a criatura assustou demais o criador. O bolo estava começando a desandar. A linha tênue ficou tensionada. E, mais que depressa, jornais e jornalistas conservadores se descolaram das suas crias, deletando mensagens abusivas em suas páginas da internet e desejando pronto restabelecimento a Lula, para que pudessem continuar o embate no campo das ideias. Mesma linha adotada por lideranças da oposição, que faziam questão de ensinar a diferença entre inimigos e adversários.
Em suma. Os aprendizes de Dr. Frankenstein correram para a fronteira que determina os limites entre a razão e a barbárie. Entre a baderna e a governabilidade. Entre as ideologias. E colocaram seus panos quentes antes que se iniciasse a contagem de quem tem mais garrafas vazias para vender, talvez numa correlação de forças diferente de 40 anos atrás.
No mínimo, poderia haver mais facilidades para se aprovar uma nova CPMF, já que há tantos bolsos polpudos preocupados com o SUS. Ou fazer avançar os projetos de regulação da mídia brasileira, a mola propulsora dos ataques preconceituosos que campeiam principalmente em território paulista.
Pois bem, pacatos e incautos cidadãos. Voltem para seus automóveis reluzentes, para seus ipads e para suas quinquilharias importadas caso não queiram entender a política como ela é de fato, e não como está sendo divulgada pelos senhores dos meios de comunicação. Estratégia eleitoral...bolo...massa de manobra...tudo muito bem desenhadinho, para mostrar que há limites a serem respeitados mesmo quando apenas se deseja levar uma vida na base do “pão-de-ló”.

domingo, 30 de outubro de 2011

Cresce Brasil!

A pior doença do ser humano não é o câncer. É o preconceito. E o preconceito sempre acaba por nos levar à barbárie, cometida nas palavras, nos gestos, no regozijo diante das crises pessoais dos seus adversários políticos. O Brasil está se tornando uma potência econômica em meio à crise mundial, mas nunca será grande de fato enquanto seus cidadãos não aprenderem a conviver com as diferenças, sejam elas nos campos político, social, sexual, regional etc. Para termos um País grande, nós, cidadãos, temos que ser gigantes por dentro. A tarefa é árdua, mas não custa tentar.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Jobs, o legado

Quatro maçãs foram importantes para a história do mundo.
Se levarmos o contexto bíblico em consideração, o marco zero da humanidade acontece com Adão e Eva, que também protagonizam o estarte para a profusão de pecados que estamos sujeitos a cometer em qualquer momento da vida. E tudo a partir de uma simples mordida, ocorrida alguns milênios atrás.
Outra maçã talvez não tenha chegado a levar uma dentada em sua carne suculenta, mas foi inspiração para Isaac Newton decifrar e estabelecer a Lei da Gravidade, importantíssima, pois nos mantém fixados ao solo de um mundo arredondado e impede que flutuemos (ou flanemos) a esmo por aí.
Nos anos 60, a mesma fruta, cortada ao meio e dividida em lados A e B, foi a divisora de águas da música popular internacional. Símbolo da gravadora Apple, ela está diretamente ligada ao sucesso de quatro garotos de Liverpool, ícones de um sonho que terminaria na década seguinte.
E, claro, mais recentemente, outra Apple entraria em nossas vidas de forma definitiva, mesmo para quem jamais pode usar um computador Macintosh, espécie de nome fantasia do mais famoso fabricante de computadores no mundo.
O logotipo dessa Apple, uma maçã mordiscada, talvez nos remeta ao pecado original, a Adão e Eva. Se eles tivessem PCs naquela época, poderiam checar no Google os riscos de se contrariar uma ordem de Deus. Talvez o mundo, desde o início, seria bem diferente do que vemos hoje.
Mas coube à Apple, de Steve Jobs, contribuir para as mudanças mais significativas na relação entre o homem e a máquina...a máquina e o homem...o homem e o homem...a máquina e a máquina...é por aí.
Se a Microsoft enjaulou o computador pessoal, com o seu absurdo sistema operacional DOS, Jobs foi mais longe: domesticou o PC. E foi bem melhor. Gates nos obrigava a decorar comandos e mais comandos no prompt daquelas telinhas de fósforo verde, ao mesmo tempo em que Jobs nos encantava com janelas e mais janelas que se abriam ao comando de um mouse, mostrando as maravilhas da interface gráfica cujo princípio é usado até hoje (apesar de que, nos primeiros sistemas operacionais do Macintosh, as janelas só ficavam abertas enquanto o botão do mouse permanecia pressionado - soltou, fechou).
Gates foi rápido no gatilho ao perceber que o futuro estava ali, pertinho, nas cercanias do Vale do Silício, e adotou as janelas como padrão, o popular Windows (ou Ruindows, como afirmam os macmaníacos e designer gráficos). O DOS, porém, permanece camuflado na embalagem colorida de todos os sistemas operacionais da Microsoft, até nos mais recentes. É, realmente, o campeão em vendas no mundo inteiro, o que enche de esperança o concorrente direto da Coca-Cola: será que um dia poderá ser Pepsi também?
Apple-Macintosh continua sendo para poucos. Produtos quase exclusivos, apenas para bolsos polpudos. Entretanto, a facilidade de uso do PC e a a mística da maçã mordida são os legados de Jobs neste mundo consumista em que vivemos. O desejo latente de se ter um "i" qualquer coisa é um sonho que está muito longe de terminar.

O primeiro Macintosh a gente nunca esquece: modelo Performa 6360 - 1 GB de HD

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Há sete anos, o massacre de moradores de rua na Sé



O massacre de moradores de rua na Praça da Sé, ocorrido há sete anos, continua impune. Quinze foram atacados enquanto dormiam. Sete morreram. As investigações não chegaram a nenhum resultado. E o que temos hoje é a manutenção dessa barbárie, agora sob o manto oficial. Avolumam-se as denúncias de maus tratos, cometidos pela Guarda Civil paulistana.
A ordem parece ser a "higienização" do centro de São Paulo. Cada metro quadrado livre desse "incômodo" é mais um metro quadrado valorizado na corretagem imobiliária desta cidade, cada vez mais cruel com os seus habitantes.

sábado, 30 de julho de 2011

Escuridão paulista

Pois é, governador, o que fazer com as suas crias, aquelas concebidas durante o processo de desestatização do setor energético paulista, já que elas não precisam dar tanta satisfação dos seus atos, como acontecia em tempos de estatização? Só lhe resta falar grosso, apresentar certa pirotecnia para impressionar os ouvintes. A Eletropaulo, distribuidora de energia, sentiu recentemente um pouco da sua aspereza, por conta da demora em restabelecer a energia após tempestades e temporais, como ocorreu recentemente.
A empresa recebeu multa pesada do Procon, de 26 milhões de reais, que não deverá pagar, pois entrará com recurso. E, por conta do pito do governador, ralhando com as malcriações feitas com o consumidor paulistano, teve que investir em propaganda e ações sociais para melhorar a sua imagem.  Feito isso, tudo voltou ao normal, como o rio que retorna ao leito em plena estiagem.
Já com a CTEEP, transmissora de energia, a mão da autoridade máxima no estado não tem sido tão pesada assim. E olha que, só em 2011, esta empresa colaborou para o caos com dois blecautes (ou apagões, como prefere dizer a imprensa tucana) – um no dia 8 de fevereiro e outro na quinta-feira, dia 28 de julho. Ambos na zona sul da Capital paulista. No primeiro apagão, que afetou 2,5 milhões, o governador determinou que CTEEP e Eletropaulo prestassem esclarecimentos ao Procon.
Sabe como é: o caçula quebra o vaso e o mais velho também tem que se explicar. Acontece nas melhores e nas piores famílias. Mas eu não soube nada sobre a aplicação de multas. Nem bolo de palmatórias ou ter que ajoelhar no milho.
Aliás, na época do primeiro blecaute, o secretário de energia disse algo sobre uma nova subestação, prometida pela CTEEP para abril de 2010, mas ainda não instalada. Já entrou em operação, secretário?
Ora, sejamos condescendentes com a transmissora. É uma empresa tão novinha! Nasceu em 1998, por decreto governamental. Se fosse gente, seria adolescente, protegida pelo ECA. E tem como nome de batismo uma sigla tão feia! Além disso, veio à luz no estilo “frankenstein”, formada com partes de uma empresa, partes de outra...foi tudo muito traumático – principalmente para os trabalhadores, catapultados para fora por alguns PDVs.
E que o leitor não esqueça que esta foi a última empresa privatizada no estado pelo próprio Alckmin, governador em 2006. Entregue aos cuidados da ISA, um grupo colombiano de energia.
Já a Eletropaulo tem 112 anos, passou por muitas transformações e transformou a cidade também. Algumas enchentes ocorrem até agora por causa dela. Sua origem está ligada ao capital canadense da antiga Light. Durante a ditadura, passou para o governo federal. No início dos anos 80 tornou-se estadual pelas mãos de Maluf; sobreviveu a Quércia mas foi esquartejada por Covas para posterior privatização das suas partes.
Hoje é controlada pela americana AES, com participação do governo federal, via BNDES. Tem o dedo da Dilma. Talvez isso ajude a explicar o porquê da fúria do governo paulista com aquela empresa anciã.
O fato é que as malcriações das energéticas tem efeito devastador na sociedade paulista. Os estragos são proporcionais ao ramo de atividade de cada uma delas. Para se ter idéia, se desligar um transformador de uma Subestação da Eletropaulo, o blecaute pode atingir dezenas de milhares de consumidores.
Mas, se cair um transformador de uma Subestação da CTEEP, o blecaute pode atingir milhões de pessoas, como ocorreu em 8 de fevereiro e na quinta-feira, dia 28 de julho...
E sabe por que tal discrepância? Porque há dezenas de subestações da Eletropaulo penduradas num único transformador da CTEEP. Calcule aí uma progressão geométrica. Se este último desliga, os outros tantos desligarão também. É o exemplo mais bem acabado do modelo energético adotado pelo PSDB paulista para privatizar o setor: a tal “desverticalização”.  O pano de fundo para o racionamento de energia em 2001, na era FHC. O modelo copiado da Inglaterra, com a grife “Tatcher”.
Antes dos Tucanos (AT), as empresas paulistas eram verticalizadas, ou seja, geravam, transmitiam e distribuíam energia elétrica. Tudo sob um único orçamento. Elas eram donas das suas hidrelétricas, linhas de transmissão, subestações, câmaras subterrâneas e postes de rua.
Na maioria dos outros estados, as energéticas eram basicamente distribuidoras, não houve necessidade de se desverticalizar (Minas Gerais e Paraná mantiveram suas empresas verticalizadas e sob controle estatal). O governo federal contribuía com Furnas e Itaipu, geradoras de energia e também transmissoras. O sistema era interligado, dividido em regiões. A produção de energia elétrica ia para uma grande "cesta" imaginária e era redistribuída de acordo com as necessidades locais. Como não havia agentes privados, a operação do sistema, também remunerada, era mais solidária, sem a pressão por lucros imediatos.
E o melhor: o governador de cada estado não precisava dar pitos públicos e ficar apenas nisso. Podia trocar diretores, refazer investimentos, ouvir a população, tratar a energia elétrica como um bem público...
Depois dos Tucanos (DT), a privatização paulista foi a mais radical entre todos os estados, graças ao porte das suas instalações. Cesp, essencialmente geradora e transmissora, e Eletropaulo, essencialmente distribuidora e transmissora, foram fatiadas por ramos de atividade. Surgiram 5 geradoras ( Cesp permaneceu estatal porque ninguém quis comprá-la até agora), 2 transmissoras (fundiram-se numa só e deveria permanecer estatal por lei, que foi derrubada) e 4 distribuidoras (uma delas manteve a razão social de Eletropaulo).
Todas foram vendidas na "bacia das almas", por um precinho camarada e com financiamento do BNDES. Os novos controladores também ganharam de presente um belo mercado nacional. Na nova interrelação entre eles, todos ganham. Quem paga é o consumidor. Energia mais cara e mais rara.
Em vez de investir na rede, os controladores remetem o lucro para suas matrizes no exterior. E, na última década, houve um rearranjo formidável no controle das empresas. Tecnicamente, o sistema permanece desverticalizado. Mas o capital verticalizou-se de novo. A AES, por exemplo, controla a distribuidora Eletropaulo e a geradora Tietê. Só falta uma transmissora para completar o time - por que não a CTEEP? Sua concessão termina em 2015...
Enquanto o sucateamento aumenta, somos obrigados a passar horas no escuro, a conviver com fiações aéreas de extremo mau-gosto, fugir de tampas de bueiro voadoras e a aceitar explicações rasas e confusas. Tudo por conta dos dividendos.
Ainda bem que temos um governador para falar duro com essa gente, que ele mesmo ajudou a criar, quando presidiu o Programa Estadual de Desestatização. Conhece bem o “idioma” vigente. No meio da tarde de sexta-feira, 29 de julho, Alckmin escalou o secretário José Aníbal para esbravejar. Afinal, o apagão do dia anterior prejudicou 3 milhões de pessoas, numa região em que houve aumento da demanda por energia nos últimos anos. Ele já disse que vai pedir à Aneel multa pesada à CTEEP. No primeiro apagão do ano, o pedido de multa foi rejeitado. Veremos agora.
Mas, dessa vez, o secretário Aníbal não falou nada a respeito da nova subestação, que deveria estar pronta em abril de 2010, para fazer frente à crescente demanda. Esse silêncio significa dizer que ela finalmente entrou em operação, secretário?

E o Carlos Tramontina, hein? O âncora mais apressado da TV brasileira. Aquele que confunde a parte com o todo. Lá pelos anos 1990, em plena era estatal, ele informou, indignado, que a Eletropaulo mantinha uma equipe de 130 jornalistas em sua assessoria de imprensa. Errou. Eram 130 funcionários da Superintendência de Comunicação, 10% de jornalistas.
Na quarta-feira, no SPTV, disse que o apagão era de responsabilidade da Eletropaulo. Errou de novo. A rede da distribuidora desligou porque não recebeu energia da CTEEP. O “pedágio”, dessa vez, falhou.


Bela imagem! Lá na Colômbia. (Banco de imagens da ISA, controladora da CTEEP)


segunda-feira, 11 de julho de 2011

O Vinho no cinema – Sideways, entre umas e outras


Sideways – Entre Umas e Outras, dirigido pelo americano Alexander Payne, está no rol das comédias românticas. Por minha conta e risco, classifico-o como um raro “eno-cult-road-movie”, safra 2004, pois mistura um pouco de tudo. Uma espécie de “assemblage”, como diria um bom conhecedor de vinhos.
“Eno”, vinho em grego, é o pano de fundo para essa história, que se passa em meio aos vinhedos californianos (se bem que o termo poderia remeter àquele famoso sal de fruta, devido ao excesso de degustações dos personagens principais).
Um dos filmes preferidos por enólogos, enófilos e bons gourmets, recebe mais um rótulo: “Cult” - gênero que agrega grupos de fãs devotos, faça sucesso ou não, pouco importando a opinião da crítica especializada. A fama crescente decorre geralmente do sistema "de boca em boca". De email em email. De tuíte em tuíte. Do Orkut ao Facebook. Por pombos-correios. Em torno deste tipo de obra gravita uma legião de admiradores que conhece cada detalhe da produção, do enredo.
Além disso, é visto inúmeras vezes pelo admirador, sempre sujeito a permanentes releituras. “Blade Runner”, o caçador de andróides, é um dos maiores exemplos (qual o significado do unicórnio nos sonhos de Rick Deckard/Harrison Ford? Hein? Hein?). “Blade” teve uma audiência considerável. “Sideways” não. Alcançou fama apenas no País de origem, mas passou ao largo do circuito comercial do Brasil. Entretanto, aqui e acolá, tem os seus fãs de carteirinha: este que vos escreve e mais um monte de amantes de um bom vinho fino.
“Sideways” é também um “road-movie”, pois o personagem principal, Miles, põe o pé na estrada – não como caroneiro, como reza a cartilha de Jack Kerouac. Nem chega a ser um Sá, um Rodrix, um Guarabira ou um Guevara na arte de transitar por caminhos poeirentos. Ele se desloca com o próprio automóvel, com o objetivo principal de afogar as suas maiores mágoas do momento, explicitadas nesta ordem: (1) desilusão amorosa com a ex-esposa; (2) o fracasso editorial de um romance que escreveu; e (3) por estar se achando um lixo de pessoa.
O roteiro de Miles (Paul Giamatti) abrange uma das principais regiões vinícolas americanas, o Vale de Santa Inez, na Califórnia. Mal de grana, ele captura os trocados escondidos por sua mãe. Hospeda-se num hotel de terceira. Vai beber vinhos baratos.
Ele viaja na companhia do amigo Jack (Thomas Haden Church), que transforma a ocasião numa despedida de solteiro, pois o altar o espera na volta.  Péssimo apreciador de vinhos, Jack procura degustar o que mais lhe interessa nesta fase pré-núpcias: a garçonete liberal de uma cantina californiana. Mas ele tem como mérito principal ser uma espécie de inspirador para um filme de sucesso recente: “Se beber, não case”. E como bebe...
Pois bem. Miles é um fracasso como escritor, um fiasco como marido. Busca a própria redenção naquilo que entende bastante, a arte de degustar um bom vinho, mesmo que seja de preço acessível. Entre uma vinícola e outra, experimenta novos vinhos, novos sabores, novas relações sociais.
 Em certo momento do filme, ele expõe a sua preferência pela uva Pinot Noir, cuja mensagem, captada pelos sidemaníacos, fez aumentar as vendas desta casta em 20% nos Estados Unidos. Em outro trecho do filme, Miles faz a execração pública dos tintos merlot, cuja mensagem, também captada pelos fãs, derrubou as vendas deste varietal! Deu para entender agora o que é um filme “Cult”?
O mais curioso é que Miles guarda em casa, para um grande acontecimento, uma garrafa de vinho francês Château Cheval-Blanc, safra 1961, região de Bordeaux, feito com base nas uvas...merlot! Bem volúvel o nosso sommelier!
Mas, afinal, o que o motivará a abrir o raríssimo “Bordeux” quase no final do filme? Para saber, basta assisti-lo, ora. Lembra das garçonetes que eu citei mais acima? Não digo quem fica com quem, mas que elas mandam bem em termos de vinho...
Também sou sincero em afirmar que não deve ser fácil encontrar o DVD nas locadoras. Talvez os telecines da vida o reprisem um dia desses (ou vários dias desses, eh, eh).  Se tiver alguma habilidade na internet, tente baixar via torrent, antes que proíbam. Ou busque no camelô mais próximo de sua residência.
Se nada disso der resultado, e não for amigo de algum sidemaníaco, a única saída é criar o seu próprio roteiro, o Sideways 2: encarnar o espírito de Miles e viajar para o Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul. Uma vinícola está grudada na outra. A degustação é livre. De taça em taça, você sorve na prática garrafas inteiras de vinho em questão de horas. Já fiz isso em viagem de turismo. Imagine o dia em que eu estiver na pior comigo mesmo, ou souber que quase ninguém leu esta crônica...

(Este texto foi escrito sob efeito de um Marcus James Tannat, produzido na Serra Gaúcha. Safra 2008. Barato e honesto. Não promete nada além do que oferece)

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Top 5

Por ocasião do resultado inédito num clássico do futebol paulista no último final de semana, fiz uma lista de cinco músicas cujos títulos remetem à histórica goleada. Usei como critérios de escolha os numerais e certas gírias futebolísticas. Entenda a seleção como singela homenagem ao Timão e discreta gozação ao clube tricolor. Não há qualquer menção a antílopes ou coisas do gênero. E a variedade de ritmos pode agradar a gregos, troianos e aos torcedores dos outros clubes.


Tema de Hawaii 5-0, seriado muito famoso nos anos 70, que está de volta, rejuvenescido. A música é a mesma de antes. Também rejuvenescida.


O baixista de jazz-rock (ou fusion) Jaco Pastorius aparece com a música instrumental "The Chicken", gravada ao vivo em Montreal na década de 1980. Para os fãs do gênero, vale a pena!


Após um clássico, nada melhor do que música.....clássica! Tem Beethoven chegando no pedaço, prá galera. Sinfonia n° 5. Com Leonard Bersntein.


Tim Maia canta "Chocolate", ao vivo, imperdível! (não adianta vir com guaraná prá mim, é chocolate o que eu quero beber...)
  

"Take Five" é uma música clássica do jazz, que consagrou o pianista Dave Brubeck. Lembrei-me dela naquele domingo, ao cair a tarde. Em português, quer dizer "Levar cinco". No video, o guitarrista George Benson dá um show de improvisação. Faz tabelinha com o sax de Sadao Watanabe. Para os amantes do jazz e dos clássicos...

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Os jalde-negros

Em plena era da lógica de mercado no mundo da bola, adentra ao gramado o futebol pragmático e globalizado. Veste uniforme impecável, de alta tecnologia, repleto de logomarcas. Pela linha lateral, na zona menos iluminada do campo de jogo, sai direto para o vestiário o futebol pitoresco, folclórico, que beira o romantismo. Aquele das camisas desbotadas, com um pequeno anúncio da Quitanda do Olegário costurado nas costas. Entram em campo os “cases” e saem “os causos”.
Porém, a principal vantagem de se morar num país de dimensões continentais com ampla diversidade cultural é que há sempre um “porém”. É o que salva o pouco que nos resta de história e o que alimenta as nossas parcas tradições. Felizmente, algo escapa dos tentáculos financeiros que controlam a nossa vida. A fugir do pla-ne-ja-men-to. E os raros “causos” precisam ser contados com urgência, antes que caiam no esquecimento.
E vamos de mala e cuia ao Rio Grande do Sul. Mais precisamente, ao Pampa Gaúcho. Município de Bagé, apelidado de Rainha da Fronteira por ser quase divisa com o Uruguai.
Posso dizer que conheço bem este lugar. Visito-o quase que ininterruptamente há 22 anos, mesmo tempo que eu tenho de casado com uma bageense. Cidade bem estruturada, administrada pelo PT há dez anos, oferece ampla gama de serviços.
Um dos destaques é a sua vida noturna. Bares, restaurantes, baladas e danceterias não têm hora para fechar. Se lá pela tantas bater a fome, sempre haverá um ambulante na esquina a oferecer graúdos lanches por preços módicos – cobrados em pilas, naturalmente, apelido do Real por aquelas bandas.
A base da economia é a pecuária, o beneficiamento de arroz e a agricultura em geral. Nos últimos anos, os investimentos em uvas viníferas cresceram muito na região, cuja combinação de solo e clima é ideal para a produção de vinhos finos.
Do futebol local, conheço mais a fundo o Grêmio Esportivo Bagé, por influência do meu cunhado, Paulo, que não tira a camisa do clube nem para dormir. O seu único título estadual foi conquistado em 1925. De lá saiu Tupanzinho, atacante que brilhou no Palmeiras nos anos 60. O uniforme principal é formado por listras verticais amarelas e pretas, semelhante ao do Peñarol, do Uruguai. Ambos são chamados de jalde-negros (jalde: amarelo forte, da cor do ouro).
Mas nem tente afirmar que o Grêmio Bagé inspirou-se no clube uruguaio. Arrumará briga, na certa. Provavelmente, o amarelo dos co-irmãos é homenagem ao sol que brilha mais tempo no céu naquelas bandas orientais. Mas que as camisas são praticamente idênticas, não há dúvida.
O arquirrival do Bagé é o Guarany, alvirrubro, que também teve o seu ápice no futebol gaúcho décadas atrás. O maior nome da sua história é Saulzinho, artilheiro do Vasco também nos anos 60. Nas nossas visitas à cidade, sua casa é parada obrigatória, pois ele tem parentesco com Marta, minha esposa.
Bem, feitas as devidas apresentações, vamos ao “causo”, recentíssimo, mais fresco do que fofoca no twitter, como diria certo analista que deu fama à cidade.
Bem, para os dois clubes de Bagé, 2011 iniciou assim: ambos na 2ª divisão do Campeonato Gaúcho, com possibilidades de acesso para a divisão principal, ao lado dos grandes.
O Guarany, mais conservador, procurou jogadores no próprio Estado. Já o Grêmio Bagé, num lance de modernidade, trouxe, por meio de investidores, um grupo de jogadores dos clubes menores do Rio de Janeiro.
Todos sabem que gaúcho se adapta facilmente em qualquer lugar do País. Mas o contrário é uma incerteza. Não são todos os brasileiros que se dão bem no Rio Grande do Sul. Principalmente nos pampas. No verão, o calor é de rachar. No inverno, o frio é de trincar. Na paisagem, predomina a planície. Não há morros. Muito menos bailes fanques.
E o futebol jogado no interior do Estado é mais disputado do que palco de trio elétrico em parada gay. Resultado: bem antes dos garotos cariocas se adaptarem ao meio-ambiente e esquentarem os tamborins, o Grêmio Bagé entrou em queda livre na tábua de classificação. No 1º turno, perdeu cinco partidas seguidas – uma delas para o rival em pleno estádio Pedra Moura – e empatou uma. Na lanterna do torneio, o sinal amarelo brilhava, anunciando a ampla chance de descenso.
O Guarany estava ligeiramente melhor: quatro derrotas e duas vitórias. Não figurava entre os últimos, tampouco entre os primeiros. Tanto poderia se classificar para a 2ª fase quanto ser rebaixado, dependendo do desempenho nas próximas partidas.
No 2º turno, a troca de técnico não melhorou o desempenho do jalde-negro. Após mais duas derrotas, seguidas, o Grêmio Bagé foi jogar a sua sorte em Rio Grande, contra o São Paulo. Era vencer ou vencer. Perdeu por 2X1. Rebaixado e cabisbaixo, amargou outra derrota na sequência, jogando em casa.
Já o Guarany permanecia em situação crítica, aquela de “ir ou rachar”. Em quatro jogos do 2º turno, perdera uma e empatara as outras três. A próxima partida, decisiva, seria em casa, no estádio Estrela Dalva, contra o arquirrival – àquela altura, um verdadeiro zumbi vagando pelo torneio em busca do repouso final.
Pois estava escrito: este “Ba-guá”, 406º confronto entre ambos, certamente ocuparia lugar na história de Bagé. O Guarany precisava da vitória para tentar sua classificação à fase seguinte. O Grêmio Bagé entrava em campo em busca da honra perdida numa campanha desastrosa.
Estádio lotado. Jogo tenso. Alvirrubros no ataque. E o goleiro jalde-negro pegando tudo. De repente, um ataque do Grêmio...e Jabá fez um a zero. No início do 2º tempo, o Guarany empatou. Mas quem pôs o Grêmio novamente em vantagem? Jabá. Ele, que amargou o banco de reservas ao longo do campeonato. Ali estava a sua chance. E a aproveitava da melhor forma possível.
Aos 36 minutos, novo empate do Guarany. O jogo se encaminhava para o final. Era o adeus dos alvirrubros à classificação, mas poderia significar a permanência na segundona. Porém, o futebol tem sempre um “porém”. Nos acréscimos, um contra-ataque do Grêmio. A bola sobrou para Jabá, que tocou no canto. A bola resvalou no pé do zagueiro e se aninhou na rede. Jabá, o herói da partida. O anjo vingador. Agitando a camisa suada como estandarte, ameaçou dar a volta olímpica, mas foi aconselhado a seguir para o vestiário.
Festa mesmo aconteceu na Avenida Sete, principal da cidade, com direito a buzinaços e bandeiraços. Naquela noite jalde-negra, 14 de abril de 2011,“revival” de 1925, comemorou-se o rebaixamento do rival, a primeira vitória no torneio e, talvez, o entrosamento tardio dos jogadores cariocas, que ainda levaram o Grêmio a mais uma vitória no jogo seguinte.
O resultado desastroso para o futebol bageense pode ser encarado como “o mal que veio para o bem”. Afinal, estão garantidos mais dois Ba-guás em 2012. Na 3ª divisão do estadual gaúcho. Que, como diz Ivete Sangalo, “é lenha”. Ou: mais amargo que tomar chimarrão feito com boldo do Chile.
Pois é, caro leitor. Rivalidade é rivalidade. Nem que a disputa aconteça no paralelepípedo, com bola de meia ou tampinha de refrigerante. Romantismo é bem isso, é o que fica na memória do torcedor e o que falta nesses tempos extremamente profissionais do futebol brasileiro.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Para qual clube torce o UOL?


Uma imagem vale mais do que mil palavras, concordo. Talvez nem fosse necessário postar este texto no rodapé. Mas vale passar as seguintes informações: a capa do UOL é do dia 13 de junho de 2011, por volta das 14 horas. Dia seguinte à vitória do Corinthians sobre o Fluminense, que o deixou na vice-liderança do campeonato brasileiro.
No destaque, no alto da página, uma notícia referente ao São Paulo Futebol Clube, atual líder do torneio. Notícia positiva. Descobrimos que o sucesso do tricolor do Morumbi na conquista do tri brasileiro - pasme - se deve a Wiliam Bonner. Pelo menos na opinião de Muricy.
Do meio da página para baixo, três notícias sobre o Corinthians. Uma neutra (ou neutra demais, leia a chamada do Terra: "morre o ídolo do Corinthians que marcou gol histórico em 1971"); uma notícia negativa: o envolvimento do ex-jogador Gilmar Fubá com o roubo de automóveis, cuja prisão foi divulgada erroneamente pelo UOL, horas antes. E, quase no pé da página, mais uma notícia, bem lá embaixo, de pura sacanagem: após levar tiro do corintiano Castan...
Realmente, é difícil para o grupo Folha seguir o seu próprio manual de redação. Ou disfarçar a sua vocação para ser o porta-voz da elite paulistana, avessa a tudo que cheira a povo. Ex-jogador não é representante do seu ex-clube. E o clube também não é responsável pelas atitudes dos seus atuais jogadores fora do campo, como o "tiro" (sem querer, de chumbinho) desferido por Castan.
Mas o que a página insinua é que o clube do Parque São Jorge está sempre relacionado às notícias policiais, fazendo coro com as brincadeiras dos torcedores de times adversários. Graças ao UOL, Gilmar Fubá ficou entre os TTs do Twitter no final desta tarde. Com a ajuda do UOL, Gilmar Fubá já foi condenado nas rede sociais. E, com ele, o clube do Parque São Jorge.
A página de hoje à tarde não entra para o rol das infelizes coincidências. Basta observar com mais atenção a postura da Folha de São Paulo e dos seus filhotes editoriais com o futuro estádio do Corinthians em Itaquera: vai da má vontade à pura zombaria em questão de parágrafos. O tom jocoso está presente no apelido que deram à obra: "Itaquerão", nome estranho para uma população que não tem por hábito colocar os seus estádios no aumentativo. Não se ouve falar pela cidade em Morumbizão, Canindezão, Belmirão, e por aí vai.

PS: A elite paulistana e os jornais que a representam não querem a abertura da Copa em Itaquera. Ou melhor, não querem jogo enhum da Copa em Itaquera, bairro pobre da zona leste paulistana. Para eles, a alternativa é deixar São Paulo fora do torneio mundial, já que o estádio do Morumbi está descartado. 
Parece que o plano está dando certo. A CBF pensa em levar a abertura a outra capital. Para deleite de alguns moradores de Higienópolis, que não aguentam mais ouvir falar em"gente diferenciada". E para alívio do governador paulista, que teria que investir pesado em obras sociais numa região extremamente carente.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

A insustentável leveza do discurso político

A preservação do meio ambiente e a sustentabilidade são temas cada vez mais presentes no dia-a-dia do cidadão brasileiro. Caso não sejam adotadas ações que visem descontaminar o planeta e que preguem a conscientização, projeta-se um futuro crítico, com poucas perspectivas de uma vida saudável.
Mas, até que ponto as atitudes dos nossos governantes são para valer, para mudar realmente este estado de coisas? Muitas vezes suas ações não passam de puro marketing, com o único objetivo de estar alinhado com o assunto do momento e ganhar pontos com isso.
Por isso, é preciso tomar muito cuidado com o discurso ambiental. Pode ser sincero, é claro! E também pode ser apenas um "factóide", ou seja, uma estratégia política de criar pequenos fatos positivos que repercutem na mídia, sem profundidade suficiente para atingir a população como um todo.
A questão ambiental tem rendido alguns dividendos políticos ao atual mandatário da Prefeitura Municipal de São Paulo. Da lei da cidade limpa à proibição de sacolinhas plásticas em 2012, o prefeito tem anunciado muitas ações nesta área. Algumas incompletas, como a instalação de cem parques na cidade, meta difícil de ser alcançada e que tem se notabilizado por alguns improvisos, como se vê na reportagem (clique aqui); outras, exageradas, como o plantio de árvores em vários quilômetros de calçadas que, sem a devida manutenção, transformam canteiros em depósitos de entulho; e há aquelas que mexem diretamente no bolso do cidadão. A inspeção veicular, cuja taxa (R$ 61,98) é maior do que o próprio licenciamento do veículo (R$ 59,33), apresenta resultados questionáveis no que tange à melhoria do ar.
Não foi à toa que, recentemente, Kassab anunciou o secretário do Verde e Meio Ambiente, Eduardo Jorge, como o nome preferido para sucedê-lo, tal é a quantidade de projetos em torno do meio ambiente.
Entre os dias 4 e 5 de junho de 2011, a Prefeitura realizou a Virada Sustentável, com o objetivo de estimular a conscientização no trato do lixo urbano. E novamente, o evento, circunscrito a uma pequena região (nobre) da cidade, foi destaque na mídia.
Entretanto, o discurso sustentável da Prefeitura está longe de chegar à periferia, que sofre com o descaso ambiental no tocante à coleta de lixo urbano. Na Vila Silvia, por exemplo, bairro da zona leste, próximo ao Cangaíba, a empresa responsável por este serviço adotou a prática de destacar um funcionário para recolher o lixo das casas, empilhá-lo em alguns pontos das ruas, geralmente nas portas das residências, e só depois passar para recolhê-lo.
Até chegar o caminhão, os cães soltos fazem a sua festa particular, com muita fartura. O procedimento é corriqueiro em outros bairros adjacentes, apesar das reclamações. Há casos em que moradores foram impedidos de sair com seus veículos da garagem, tal o acúmulo de lixo. Há 3 anos, o empilhamento de lixo na praça Natal Antonio da Cunha, num sábado, causou constrangimento no subprefeito da época, que fora à localidade para reunir-se com a associação de moradores para discutir outros assuntos.
Já foram registradas reclamações de moradores no 156, na Secretaria Municipal de Serviços e na Loga, empresa responsável pela coleta domicilar no bairro. Mas nada foi feito até o momento. Nesta região, a sustentabilidade ficou apenas na propaganda.
Portanto, recomendamos muita cautela quando você, leitor, ouvir o discurso ambiental dos governantes, sejam eles da esfera federal, estadual ou municipal. Assim como praticamos a coleta seletiva em favor do meio ambiente, devemos ter muita seletividade em tudo o que ouvimos por aí.
RECLAMAÇÕES NA PREFEITURA SP: 156
RECLAMAÇÕES VIA INTERNET: http://sac.prefeitura.sp.gov.br/
RECLAMAÇÕES NA LOGA: 0800-770-1111
RECLAMAÇÕES NA LOGA VIA INTERNET: http://www.loga.com.br/

Empilhamento de lixo nas ruas: o discurso sustentável não chegou à periferia

sexta-feira, 13 de maio de 2011

2006, o ano que vivemos em perigo

Capa do relatório "São Paulo sob achaques" - ONG  Justiça Global
De maio de 2006, os paulistas trazem na memória alguns dias de pânico e terror. Algo jamais vivido em toda a história do estado. Ou visto apenas em filmes e enlatados americanos, onde cidades ficavam à mercê de terroristas, criminosos ou catástrofes naturais.
Aqueles tristes dias de maio começaram com uma série de rebeliões nas penitenciárias paulistas; era a senha para começar uma onda de ataques às instalações da polícia e aos próprios policiais. Muitos foram executados. Bombeiros, policiais fora do horário de serviço e agentes penitenciários eram os alvos.
E, rapidamente, as cidades começaram a paralisar suas atividades, graças aos rumores de que a facção havia implantado o toque de recolher em diversas localidades. O comércio fechou as portas. Ônibus foram incendiados. Os cidadãos foram dispensados mais cedo do serviço. Por volta das seis da tarde, as ruas de São Paulo estavam desertas. Todos haviam perdido a confiança nas autoridades paulistas, apesar das afirmações de que a situação estava sob controle.
No terceiro dia, os ataques refrearam. Quase que por encanto, tudo havia voltado à normalidade, deixando no ar algum tipo de acordo com os membros da facção. E deixaram um saldo de 46 mortes, funcionários do Estado em sua maioria. Enquanto boa parte da população se recuperava do pânico, outra onda de ataques, dessa vez mais silenciosa, acontecia nos cinturões de pobreza das grandes cidades: o revide da polícia.
Sob a alegação de envolvimento com as ações criminosas dos dias anteriores, centenas de jovens da periferia foram executados. Trabalhadores. Estudantes. Pessoas sem passagens pela polícia. Dos 493 mortos, não foram encontrados os corpos de 122.
Tudo aconteceu há exatos cinco anos. Um lustro. Porém, com o perdão do trocadilho, uma fase da história paulista sem nenhum brilho. Opaco. O governador da época é o mesmo de hoje, eleito no ano passado. O secretário de segurança de então hoje ocupa a Secretaria de Abastecimento, pronto para retornar à sua antiga pasta. 122 mães ainda procuram os corpos dos seus filhos.
Por ocasião desta triste passagem, a ONG Justiça Global divulgou um relatório, realizado em conjunto com a Clínica Internacional de Direitos Humanos da Faculdade de Direito de Harvard, que aponta a principal causa da onda de ataques: os constantes achaques que os líderes da facção, aprisionados, recebiam dos policiais. O material traz documentação farta, depoimentos – faz menção aos acordos entre autoridades públicas e criminosos para por fim à violência e mostra que a política prisional paulista apresenta os mesmos defeitos de antes.
Também nesta data, no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, foi lançado o livro “Do luto à luta – Mães de Maio”, editado por Débora Maria (uma das líderes do movimento) e Danilo Dara. A publicação relata o drama vivido pelas mães dos mortos e a luta para que o Estado seja responsabilizado pelos assassinatos.
“Estamos falando de trabalhadores, jovens e famílias que foram destruídas e todas estas mortes estão impunes. O Ministério Público arquivou os processos alegando que os casos referem-se à resistência seguida de morte. Estamos pedindo a anulação destes processos e a federalização dos crimes de maio. Este Sindicato é a nossa casa, é a casa da justiça e do direito de todos”, disse a jornalista Rose Nogueira, coordenadora do evento.
Esse caso escabroso, que completa cinco anos, é de arrepiar, mas infelizmente é verdadeiro. Que não se repita mais. Mas, para não se repetir mais, é preciso ter plena consciência do que levou a isso. De quem levou a isso.
Os linques abaixo ajudam o cidadão a entender o que realmente ocorreu em maio de 2006.

Programa Especial TV paga Discovery Channel


Foto: Sindicato dos Jornalistas SP