(publicado no facebook no dia 13 de outubro de 2013)
Pura
sacanagem o que a internet faz comigo a essa hora da madrugada. Em pleno dia 13
de outubro, na data que entrou para a história do futebol como o dia da quebra
do jejum. Ou quando o Corinthians saiu da fila de quase 23 anos, período em que
ficou sem conquistar campeonatos paulistas.
Graças
à rede mundial, tenho acesso fácil aos depoimentos de torcedores, às narrações
de rádio da época, às imagens e fico tentando segurar as lágrimas para não
manchar o sofá novinho em folha, comprado com tanto sacrifício. Saiba, leitor
ou leitora, que lágrimas de corinthiano não secam, alguém vai reclamar do
tecido molhado!
Movido
pela emoção, me devolvo ao dia 13 de outubro de 1977, uma quinta-feira, ao
exato momento em que acabo de sair do hospital onde minha mãe tinha sido
internada dias antes, em decorrência da esclerose múltipla, doença pouco
conhecida até então.
Volto
para casa ao lado do meu pai. Falamos pouco no caminho. Em meio à desesperança
que a doença provoca, escoramos nossas almas na esperança do tão sonhado
título.
Jantamos
o arroz-feijão e qualquer coisa que sobrara do almoço. Na mesa, dois lugares
vazios. Minha mãe, já disse, no hospital. O irmão mais velho, músico da noite,
cumpre sua jornada no “Avenida Danças”, casa noturna do centro.
Os
dois corinthianos da família se acomodam no sofá da sala. Enquanto o jogo não
começa, faço as minhas contas: bem, tenho apenas 16 anos. Se perdermos, meu
prejuízo será menor. A minha idade sem ver o título paulista. Mas meu
pai...comemorou o último título aos 27 anos. Já está com 50. Um intervalo
doloroso na melhor fase da vida!
O
jogo começa. O jogo avança. Está quase para terminar. E no bate-e-rebate da
bola que cai no pé de Basílio e do pé do Basílio vai parar na rede e meu pai
corre para me abraçar. Abraço forte e demorado. Leva mais tempo que uma volta
olímpica no gramado. Quase a duração do jejum de títulos. Pela primeira vez o
vejo chorar. Chorar copiosamente, assim, em público: eu, muito perto, e mais
150 mil pessoas, logo atrás, nas imagens da TV. Ao redor, mais alguns milhões
de almas alvinegras.
O
juiz apita o final do jogo. Descemos a escada do antigo sobrado do Belenzinho.
Alcançamos a rua. Ficamos sentados no meio-fio por muito tempo, em meio à festa
popular. Quase a duração das 23 voltas olímpicas que fizeram tanta falta no
coração dos corinthianos.
Já
na alta madrugada, chega a hora de dormir. “Comemorar também cansa, pai. Amanhã
vai ser um dia duro. A mãe no hospital, a minha escola, o seu trabalho. Os
afazeres domésticos...boa noite, campeão!” Ele retribui o cumprimento e se
enrola nas cobertas, feliz por voltar a ostentar a faixa imaginária no peito, a
mesma de 1954, que ainda lhe cai muito bem!
No meu quarto, mal encosto a cabeça no
travesseiro e me ponho a sonhar. A viajar no tempo, 35 anos à frente. Bem no
período em que o Corinthians salta da América e chega ao topo do mundo, todo
poderoso.
Vejo
a metade da cidade comemorando nas ruas, observo o orgulho dos mais jovens por
serem as testemunhas oculares do melhor que aconteceu em toda a história do
clube.
Do
mesmo jeito que eu me sinto agora, em 1977, após a conquista heroica! Ou como
me sentirei, no futuro que o meu sonho aponta. Momentos de igual emoção. Com
uma diferença: em 2012, no ano das grandes conquistas, não terei o “seu”
Américo ao meu lado, a correr para um abraço no instante do gol.
Aliás,
uma baita diferença...