terça-feira, 30 de novembro de 2010

Adeus, Monicelli


Cena do filme Quinteto Irreverente (Amici Miei II), de Mario Monicelli, 1982

O cinema está encolhendo. O que eu mais temi ao longo dos últimos anos já aconteceu. Virou simples entretenimento, para arrasar quarteirões. O filme de autor, de quem tinha uma câmera na mão e uma ideia na cabeça, está com os dias contados. Alan Resnais ainda resiste, com Medos Privados em Lugares Públicos. Jean-Luc Godard, Ettore Scola e Bernardo Bertolucci estão vivos e podem dirigir algo a qualquer momento. Podemos incluir Giuseppe Tornatore neste grupo? Sim, podemos.  A Lenda do Pianista do Mar e Cinema Paradiso o credencia a entrar no seleto grupo. Ou melhor, no exército brancaleone do cinema mundial, cuja vaga foi aberta ontem, dia 29 de novembro de 2010, com o suícídio do diretor de cinema Mario Monicelli, aos 95 anos.
Tudo bem, Monicelli não fazia exatamente filmes de arte, expressão que usávamos nos anos 70/80 para diferenciá-los dos "aeroportos" e "infernos na torre" que ocupavam os letreiros de praticamente todos os cinemas de São Paulo. Mas Monicelli fazia um cinema especial. O "Exército", uma crítica escrachada ao fascismo, virou sinônimo das minorias que lutavam contra as imposições da indústria cultural. Ou contra o sindicalismo pelego. Ou contra o neoliberalismo que começou a nascer logo após o fim da ditadura militar.
Entretanto, o item de sua vasta obra que mais me fascina é Quinteto Irreverente. Acho que, ao assisti-lo no cine Belas Artes da rua da Consolação, quebrei o meu recorde de gargalhadas num só filme. Sequência de "Meus Caros Amigos", "Quinteto" é a história de cinco velhos companheiros que novamente se unem para sair "aprontando" pela Itália, como nos tempos de escola.
A sua exibição no Brasil coincidiu com a conclusão do meu curso de jornalismo, período em que eu e mais seis alunos consolidamos uma amizade duradoura que perdura até hoje, apesar dos rumos diferentes que cada um tomou. E posso dizer que durante anos "aprontamos" muito por aí, mas sem chegar ao ponto de estapear a cara dos passageiros de um trem logo que se pôs em movimento, como mostra a cena acima.
A similaridade com o nosso grupo estudantil foi um ingrediente a mais para idolatrar o filme. Daqui a uma semana, tenho encontro marcado com essa turma. O primeiro e, talvez, último do ano. Vou com a certeza de que iremos levantar um brinde a Monicelli. Por aquilo que sua obra representou num momento muito importante das nossas vidas. 

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Nada de novo no front

Marcelo de Jesus/UOL
Tomada de Monte Castelo? Não, invasão do Morro do Alemão

Chamem o Joel Silveira. Chamem o José Hamilton Ribeiro. Há mais uma guerra a cobrir. Com o perdão do trocadilho, mais uma guerra com "alemão" no meio, Joel. Em termos de comparação, uma guerra semelhante à do Vietnã, Hamilton. Fraticida. Uma guerra doméstica, bem pertinho das principais redações da região Sudeste.
É a chance de recuperar a audiência perdida por bobagens como bolinhas de papel na cabeça de presidenciável. É a possibilidade de se voltar a vender mais jornais do que na época do Plano Cruzado, quando se quebravam recordes de tiragem por causa da publicação das tabelas com preços congelados de vários produtos.
É também a tentativa de mostrar à CNN como se faz um bom jornalismo em tempo real durante a cobertura de uma guerra. E, quem sabe, pode ser possível criar uma capa em certa revista semanal de forma a fazer respingar o ataque dos traficantes no novo governo que se inicia. Que tal perto da posse?
Como bem mostrou José Arbex Jr. em seu livro Shownalismo. O título explica muito do que vemos na TV. Mais uma vez, a notícia foi tratada como um grande espetáculo. E como todo grande espetáculo, houve apelo fácil às emoções. Eu juro que li num jornal de São Paulo: "na favela da Grota, os agentes ficaram a menos de cem metros de uma casamata que serviu de abrigo a traficantes". Casamata? Sempre havia uma casamata nos filmes da 2ª guerra que passavam na Sessão da Tarde. Acho que em "O Resgate do Soldado Ryan" também havia muitas casamatas. Duvido que os traficantes soubessem do que se trata.
Faltou falar em campo minado. Em bunker. Mas o Jornal da Globo não se furtou a explicar que os traficantes de uma facção aprenderam táticas de guerrilha com os presos políticos brasileiros...nos anos 70. Se estivessem no Vietnã, na mesma época, os vovôs do tráfico certamente aprenderiam a cavar redes de túneis em todos os morros, onde ficariam escondidos; à noite, saíriam para incendiar veículos e emboscar policiais e soldados do exército. Porém, de alguma forma, a imprensa deu um jeito de culpar a esquerda. Que tal abrir os processos dos camaradas presos em Ilha Grande para saber se há algum indício de que o "aprendizado" foi intencional?
E já se fala em Tropa de Elite 3. Na glorificação do BOPE. Mas não é o mesmo BOPE do Tropa 1? Onde o Capitão Nascimento usou a tortura como método de convencimento e o próprio Batalhão só agiu com vigor em retaliação ao assassinato de um agente, num espírito de corpo de dar medo? Serão nossos heróis daqui em diante, com direito a histórias em quadrinho?
No final das contas, goste-se ou não do governador Sérgio Cabral - e parece que a Globo começou a gostar dele -, ele fez o que tinha que ser feito. O governo federal movimentou tropas e equipamentos como deviam ser movimentados. Presos foram transferidos para presídios de segurança máxima e "advogados-correios" foram presos. A grande maioria dos cariocas ratificou o apoio dado aos reeleitos nas últimas eleições. 
E o jornalismo brasileiro parte em busca do próximo show. Não haverá muito o que falar até a posse de Dilma. Nem imediatamente após. Nesse meio tempo, moradores de rua continuam sendo queimados e assassinados, favelas paulistanas sofrem de combustão espontânea e minorias permanecem como alvos de neonazistas e mafiosos mirins. Meras notícias nos pés das páginas, sem muita repercussão. Afinal, para combater esses crimes, seria necessário invadir o quê: prédios de alto padrão?

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Íntegra da Coletiva de Lula - 24/11


A entrevista coletiva do presidente Lula para blogueiros, realizada hoje pela manhã, foi transmitida ao vivo por este e por vários blogs brasileiros.

A mídia alternativa sobe a rampa

Quarta-feira, dia 24 de novembro de 2010, será um dia histórico para a mídia alternativa, que fincou uma "cabeça de ponte" na internet e participou ativamente da eleição para Presidente da República. Nesta data, às 9 horas, o presidente Lula recebe blogueiros para uma entrevista coletiva, com transmissão ao vivo pelo Blog do Planalto, com participação dos internautas.
As eleições deste ano foram marcadas, por um lado, pela manipulação acintosa da grande mídia brasileira em favor do candidato da oposição. Foi algo jamais visto em períodos eleitorais, mesmo considerando todos os pleitos anteriores, incluindo o de 1989. Do outro lado, na trincheira virtual formada na internet, vários blogueiros e tuiteiros tiveram participação ativa na missão de levar informações verdadeiras ao grande público, responder a atos preconceituosos, derrubar factóides e limpar a sujeira deixada por uma campanha alimentada pelo ódio.
 Eu creio que a vitória de Dilma Roussef no segundo turno se deveu em boa parte à atuação desta mídia alternativa, que esteve ao seu lado em todas as horas. O debate eleitoral na internet trouxe de volta os militantes que tinham deixado as ruas há algum tempo, substituídos pelos cabos eleitorais pagos. Provaram mais uma vez que campanha de qualidade se faz com intensa politização dos agentes envolvidos. E que sirva de lição principalmente a certos setores do PT, que 'optaram" por terceirizar certos serviços.
Em relação ao jornalismo praticado no Brasil, a eleição provou que ele vive por aparelhos. Vimos profissionais de renome envolvidos até o pescoço com o presidenciável tucano. Manipulações rasteiras. Propagandas subliminares. E completo distanciamento de grande parte do eleitorado brasileiro, a julgar pelos resultados finais. Como reação natural à ofensiva da grande imprensa, outra parte do jornalismo também escolheu seus candidatos. Vestiu a camisa de Dilma. Montou seus dossiês. E soube trabalhar bem o outro lado da informação.
Entendo que, nessa contenda, a profissão saiu chamuscada. Enquanto o jornalismo no Brasil continuar a ser tratado apenas como extensão de um grande negócio, sempre haverá perda de credibilidade. Enquanto for dirigida apenas por herdeiros, de pais para filhos, sempre haverá reações à sua regulação. Enquanto não houver maior controle do jornalista sobre o resultado do seu trabalho, a profissão estará cada vez mais deteriorada.
Convém voltarmos à coletiva de Lula aos blogueiros. Há meios de se tentar equilibrar os pesos da balança. De se contrapor ao poder dos jornalões. Muitas decisões passam pelo Governo Federal. Propostas de regulação. Defesa do diploma e da melhoria das diretrizes curriculares para o Jornalismo. Rejeição ao AI5 Digital. E, principalmente, estímulo ao crescimento das mídias alternativas com incentivos fiscais. A inclusão do jornalista no Supersimples seria um grande avanço.
Há na Câmara Federal o Projeto de Lei Complementar nº 591, de autoria do deputado Vignatti (PT/SC) que altera o Supersimples e contempla aquela inclusão, entre outras mudanças. Presidente Lula, apoie esse projeto. Dê-lhe o caráter de urgência. O que vimos nestas eleições, em termos de informação alternativa, não pode ser perdido. Com a aprovação do projeto, poderá ficar para sempre.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Dona Dilma, quem fez isso com meu carro?


A Folha de São Paulo finalmente conseguiu. De tanto insistir, o Supremo Tribunal Militar tornará público o processo movido contra Dilma Roussef na época da ditadura. Mas porque tanto interesse no caso? Vasculhando a internet, achei uma possível resposta na foto acima, de um veículo do jornal semi-destruído.
Quem sabe a Folha queira achar alguma pista para saber quem detonou o seu carro, lá pelos anos 70, usado pelo regime militar para transportar presos para as dependências da OBAN. Talvez tenha a pretensão de pedir ressarcimento aos movimentos de esquerda da época, num Tribunal de Pequenas Causas.
Se não for isso, qual será a real motivação do jornal em bisbilhotar a vida pregressa da nossa presidente durante os anos de chumbo - resgatar a memória dos torturadores?
Como até o bueiro da minha rua sabe, a Folha apoiou o regime militar. Mais recentemente, classificou-o como "ditabranda", algo assim, digamos, bem "maneirinho". Algumas capas de 1964 mostram exatamente aonde estava preso o rabo da Folha: na malditadura, oras!

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O jornalismo do ódio: TV Globo SC

Guarde bem este nome Luis Carlos Prates. Gente desse tipo, com essa mentalidade, é que justifica a necessidade de criar mecanismos para enquadrar a mídia brasileira nos princípios da pluralidade de ideias, contra os preconceitos e a intolerância. Veja como anda o padrão Globo de qualidade em SC (tire as crianças da sala):

A crônica esportiva na marca do pênalti

Para muitos, foi apenas "contato físico".

Ao leitor, deve parecer óbvio que o futebol é um esporte de contato físico, pois não há redes no meio de campo a separar os dois times. Pois essa obviedade gritante se tornou o principal argumento de alguns comentaristas esportivos para defender a tese de que não houve o pênalti na partida entre Corinthians e Cruzeiro, que resultou na vitória do dono da casa.
Justamente por ser um esporte de contato físico, há um conjunto de regras que explicitam as situações em que o lance deve correr normalmente ou deve ser apontado como falta pelo juiz.
Em linhas gerais, pode haver o contato desde que não seja usado para impedir a progressão do atacante que possa resultar em gol. Se não fosse desse jeito, carrinho no pé do adversário seria lance normal. O soco, a gravata e a cabeçada também.
Pois algo assim, tão simples de entender até pelo poste da minha rua, tem sido a grande dificuldade dos nossos comentaristas de futebol, cujo inconformismo com certas marcações dos juízes os leva a analisar alguns lances sob a ótica de uma subjetividade que o conjunto de regras rejeita claramente. E eles vão mais além. Muitas vezes, utilizam como parâmetros a postura de outros árbitros em determinadas partidas. “Falta como essa ninguém marca”. Ou “ninguém marca pênalti faltando três minutos para acabar o jogo”. Ou seja: passam a classificar como exageros as decisões de juízes que aplicam tão bem as regras.
O jogo daquele sábado, dia 13 de novembro de 2010, deixou claras as deficiências da profissão de jornalista. Assisti ao jogo no pay-per-view e fiquei surpreso quando vi vários comentaristas entrarem no clima criado pelo Cruzeiro e demonstrarem indignação com o pênalti marcado. O que está acontecendo - pensei - a imprensa golpista entrou em campo? Fui zapeando entre os canais esportivos da TV a cabo e em algumas emissoras de rádio e constatei a tragédia em que se encontra nossa crônica esportiva.
Ela não chega a ser golpista. É ruindade mesmo. Muitos comentaristas, com anos de janela, desconhecem os detalhes das regras. Alguns vestem a camisa dos seus clubes. Ou até dos seus partidos, se houver alguma vinculação política de determinado time.
Um conhecido comentarista, em viagem pela Bahia, entrou ao vivo na rádio Bandeirantes para protestar contra a marcação do juiz. E, nos dias seguintes, martelou o assunto, estimulando a polêmica para segurar a audiência. Outro jornalista, da ESPN, era o mais exaltado de todos. Mostrou, também ao vivo, toda sua revolta e indignação contra o “pênalti absurdo”. Há anos ele leva adiante uma esquisita campanha contra a marcação de pênaltis. A decisão do árbitro, para este representante da liga antipênalti, logicamente virou um prato cheio. A sua fúria foi registrada também em seu blog e em outras aparições no canal esportivo.
Mas, o mais grave de tudo isso é que tais profissionais se esquecem com frequência de que não estão na mesa de um bar, entre amigos, onde podem dizer o que vier na veneta. Falam ou escrevem para milhares. Para milhões, dependendo do meio. Podem influenciar decisivamente a opinião pública e contribuir para a desqualificação, intencional ou não, das conquistas de determinada agremiação que, a princípio, venceu por seus méritos, caso não se prove o contrário.
Tecer comentários sem se preocupar com a sua repercussão é uma das falhas mais graves do jornalismo brasileiro. Equivale a acusar sem provas. A fazer ilações sem obedecer à lógica. Nesta profissão, não cabe apenas reivindicar o acesso à liberdade de expressão. A atuação do jornalista é bem mais complexa do que tal generalidade. Mais que direitos, há deveres a serem cumpridos, que passam obrigatoriamente pela boa informação. Pela verdade. Pela real apuração dos fatos. E quando se começa a brigar com a notícia ou com o registro da imagem, a credibilidade vai ao fundo do poço.
O pênalti de sábado existiu e foi bem marcado pelo árbitro. Não era para ser polêmico. Deveria haver apenas indignação dos comentaristas pela atitude irresponsável dos dirigentes do Cruzeiro, que optaram por denunciar uma improvável mutreta para encobrir a queda de produção do time na reta final. Pois, depois desse dia, de mais um vexame da mídia brasileira, quem está na marca da cal não é a bola. É a imprensa esportiva. Ou muda e se aperfeiçoa ou vai ser chutada para a bandeirinha de escanteio. Como já aconteceu com o jornalismo político recentemente, escanteado pelas urnas nas últimas eleições.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Comunicação Democrática

Não basta apenas criar conselhos para democratizar a mídia, como vem ocorrendo em vários estados do País. São medidas importantes, mas que, sozinhas, não terão muita eficácia. Outras medidas são necessárias. Restabelecer a exigência do diploma de jornalista é uma delas, acompanhada da melhoria da grade curricular do curso, para dotar o futuro profissional de visão mais profunda sobre a comunicação social.

É preciso também incluir os serviços de jornalismo no Supersimples para expandir a imprensa alternativa. Ampliar o campo profissional e disseminar a segmentação. O Supersimples poderá dar um novo gás ao jornalismo comunitário, principalmente do meio impresso.

É necessário modificar os critérios de concessão das rádios comunitárias. Hoje, é muito restritiva. Muitas das entidades contempladas na última licitação em São Paulo, após uma série de regras draconianas, ainda não obtiveram a autorização do Ministério das Comunicações. Também seria interessante oferecer linhas de crédito para a aquisição de equipamentos.

Por fim, a internet. Antes de tudo, é preciso barrar a aprovação pelo Congresso do chamado AI-5 digital, projeto de lei elaborado pelo senador Eduardo Azeredo (PSDB), que restringe de modo absurdo o uso da internet e das próprias redes sociais. Nesta eleição, os blogs tiveram uma atuação significativa no sentido de restabelecer a verdade e combater as artimanhas da grande imprensa.

As entidades de classe têm que insistir na aprovação do Conselho Federal de Jornalistas, para fiscalizar o exercício da profissão, no sentido de coibir abusos. Com essas medidas, creio que poderemos enfim iniciar o processo de democratização dos meios de comunicação, criando-se alternativas sólidas às ações golpistas de parte da imprensa nacional.