quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Com a tradição não se brinca...


   Na passagem do ano do cidadão paulista não podem faltar: o peru, o panetone, o espumante barato e docinho, a lentilha, a roupa branca, a oferenda a Iemanjá, a promoção do panetone pague-um-leve-dois, os fogos de artifício, a oferta de peru com preço de frango, pular as sete ondas, castanhas, a postagem de feliz ano novo no facebook e o principal: a falta de água no litoral.

   Pois torneira seca já virou tradição de réveillon. Mais até do que congestionamento na estrada e carnê do IPVA. Há 20 anos as pessoas se divertem com o arzinho que sai dos canos, às vezes mais forte do que o espoucar de sidra Cereser.

   É o que tem mantido a família unida, em busca dos valores essenciais para se viver bem na coletividade. A solidariedade, por exemplo, presente nas vaquinhas para contratar um caminhão-pipa. Ou a fraternidade, quando todos aguardam a vez em volta da bacia, dando preferência aos mais idosos, que relembram o momento mágico de tomar banho de canequinha – usam algumas muito antigas, de folha de flandres, vindas de outras gerações.

   E aquelas cervejinhas, hein? Que transformam os poucos copos limpos em "cachimbos da paz", circulando de mão em mão para reduzir a quantidade de louça a ser lavada.  É essa a bebida responsável pela alegria dos turistas e pelo retorno triunfal do penico de ágata, que dá um toque especial aos quartos, abarrotados de parentes e amigos.

  Já os que dormem na parte de cima dos beliches, sem acesso aos urinóis, adotam um novo ritual no culto à rainha do mar, que ganha mais e mais adeptos nas praias paulistas: ao pular as sete ondas, todos devem dar algumas agachadinhas na água de acordo com as suas necessidades. Boa solução para evitar congestionamento no único banheiro da casa que recebe algumas gotas do líquido precioso em certas horas do dia.


   A situação pode parecer dramática, mas os paulistas se divertem pra valer. Contam piadas e riem muito das declarações do governador, que sempre se diz surpreso com o afluxo de turistas às cidades litorâneas. Certamente, a desculpa esfarrapada virou mais uma tradição de réveillon. E ele, se reeleito for, fará de tudo para mantê-lo. Afinal, com a tradição de certos povos não se brinca.