Na
passagem do ano do cidadão paulista não podem faltar: o peru, o panetone, o
espumante barato e docinho, a lentilha, a roupa branca, a oferenda a Iemanjá, a promoção
do panetone pague-um-leve-dois, os fogos de artifício, a oferta de peru com
preço de frango, pular as sete ondas, castanhas, a postagem de feliz ano novo
no facebook e o principal: a falta de água no litoral.
Pois
torneira seca já virou tradição de réveillon. Mais até do que congestionamento
na estrada e carnê do IPVA. Há 20 anos as pessoas se divertem com o arzinho que
sai dos canos, às vezes mais forte do que o espoucar de sidra Cereser.
É
o que tem mantido a família unida, em busca dos valores essenciais para se
viver bem na coletividade. A solidariedade, por exemplo, presente nas vaquinhas
para contratar um caminhão-pipa. Ou a fraternidade, quando todos aguardam a vez
em volta da bacia, dando preferência aos mais idosos, que relembram o momento
mágico de tomar banho de canequinha – usam algumas muito antigas, de folha de
flandres, vindas de outras gerações.
E
aquelas cervejinhas, hein? Que transformam os poucos copos limpos em "cachimbos
da paz", circulando de mão em mão para reduzir a quantidade de louça a ser
lavada. É essa a bebida responsável pela
alegria dos turistas e pelo retorno triunfal do penico de ágata, que dá um
toque especial aos quartos, abarrotados de parentes e amigos.
Já
os que dormem na parte de cima dos beliches, sem acesso aos urinóis, adotam um
novo ritual no culto à rainha do mar, que ganha mais e mais adeptos nas praias
paulistas: ao pular as sete ondas, todos devem dar algumas agachadinhas na água de
acordo com as suas necessidades. Boa solução para evitar congestionamento no
único banheiro da casa que recebe algumas gotas do líquido precioso em certas
horas do dia.
A
situação pode parecer dramática, mas os paulistas se divertem pra valer. Contam
piadas e riem muito das declarações do governador, que sempre se diz surpreso
com o afluxo de turistas às cidades litorâneas. Certamente, a desculpa
esfarrapada virou mais uma tradição de réveillon. E ele, se reeleito for, fará
de tudo para mantê-lo. Afinal, com a tradição de certos povos não se brinca.