quinta-feira, 21 de abril de 2011

Prá não dizer que eu só falei das flores

É claro que sou um amante da natureza. Um admirador de paisagens. Sempre procuro lançar um olhar contemplativo aos campos, às matas e às florestas, na certeza de que a verdadeira vida está lá fora – nas plantas, nos frutos, nas flores – no encadeamento entre os diversos seres vivos, dos microscópicos aos macroscópicos.
Tenho também uma certa verve poética que, se não me aproxima dos mestres do arcadismo, ao menos serve para produzir textos bucólicos, nas vezes em que preciso falar sobre o meio-ambiente, como agora, nesse momento.
Não que eu queira me gabar, mas traduzir em palavras a sinestesia que o verde nos traz até que é tarefa das mais fáceis. O meu drama começa quando tento intervir na natureza. quem não lembra dos versos de “Cio da Terra”, clássico do cantor Milton Nascimento? Debulhar o trigo, recolher cada bago do trigo, forjar no trigo o milagre do pão e se fartar de pão...
Pois é. Só o último ato eu faço com perfeição, além de escrever e fotografar paisagens. De resto, assumo minha nulidade no trato com a terra. Até hoje confundo rosas com begônias. Almeirão com alface. Não sei diferenciar um ipê de um jequitibá. Compro limas pensando serem laranjas. Não me engano na escolha de melancias ou abacaxis, mas jamais consegui descobrir quando eles estão “no ponto” para consumo.
Tenho em minha defesa que sempre levei uma vida essencialmente urbana. Sou paulistano, nascido no bairro do Brás, bem pertinho do centro da cidade. E, já naquela época, nessa região, pouco se viam pés de fruta nas casas dos vizinhos. Árvores frutíferas eram arrancadas para fundear indústrias, redes comerciais e casas geminadas. Enfim, não vi vacas pastando na minha rua, mas já andei muito de bonde elétrico...
Digo isso porque ainda mantenho o desejo de aprender a lidar com a terra, não apenas cantá-la em verso e prosa. Onde moro, não há cursos disponíveis. Certa vez, o parque municipal próximo à minha casa iria dar um curso de jardinagem. Pensei em me inscrever, mas foi cancelado por falta de alunos.
Para transformar a sociedade brasileira em algo – digamos – pastoril, só nos resta apelar para os meios de comunicação.  Que falem mais da natureza, não só no Globo Repórter. Que os enredos de novela tratem de verdejantes duelos de ecologistas, no lugar de assassinos em potencial. Que os jornais deem em suas primeiras páginas a descoberta de flores raras, a existência de árvores centenárias, o uso intensivo de plantas para fins medicinais. Que os partidos políticos se tornem esverdeados pela clorofila, não por causa do dólar.
 Estou à disposição dos pauteiros como fonte para matérias de interesse humano (algum jornalista ainda lembra o que é isso?). Como outros tantos, sou alguém excessivamente urbano, estressado, que precisa urgentemente desacelerar.
(Falei das flores, que às vezes trazem espinhos. A chacina na escola do Realengo foi uma fatalidade, difícil de ser evitada. Ainda não foram inventados detectores de loucura. Mas os insanos costumam agir em total sintonia com os assuntos do momento. Eles captam com maestria os temas de apelo fácil, que elevam e seguram a audiência; e que – estranha obsessão - permanecem tempo demais na boca do povo. Se falássemos mais de flores e jardins, se câmeras de segurança transmitissem ao vivo o instante da fotossíntese, poderíamos presenciar uma chuva de pétalas sobre os adolescentes do Realengo, em vez de uma tempestade de balas)

Composição e interpretação de Mario Espinheira, acompanhado das imagens de flores da caatinga.

sábado, 2 de abril de 2011

Shortcuts, cenas da vida (tributo a Robert Altman*)

O deputado federal Jair Bolsonaro ataca negros, homossexuais, cotas escolares, e especialmente, Preta Gil, durante entrevista ao programa CQC.

Maria tem a maioria dos votos dos espectadores e vence o BBB. Nas redes sociais, internautas enxergam na sua vitória a derrota do machismo e do preconceito contra as mulheres.

O deputado federal Jean Willis, ex-BBB e ativista de movimentos gays, entra com representação contra Jair Bolsonaro, devido às sua explícita homofobia.

A Rede Globo introduz as premissas do BBB em seu noticiário. Transmite, durante o horário nobre, imagens de assassinato captadas por câmeras de segurança.

Duas irmãs adolescentes são assassinadas a tiros no interior do estado de São Paulo. Os corpos foram encontrados na mata. Suspeita-se de crime sexual.

No programa Amor & Sexo, na Globo, o assunto é a depilação na região dos órgãos genitais. O cantor Latino diz que adotou a prática, pois deixa o membro “maior”.

Uma “panicat”, modelo que trabalha no programa Pânico na TV, vai ao jogo São Paulo X Corinthians apenas de biquíni, para uma gravação, e fica no meio da torcida.

O presidente da FIFA, Joseph Blatter, critica o Brasil pelos atrasos nas obras para a Copa do Mundo, principalmente nas cidades de São Paulo e Natal.

A construção da hidrelétrica de Jirau, em Rondônia, é paralisada devido a protestos dos trabalhadores contra os maus tratos a que são submetidos.

No Japão, os índices de radiação provenientes da usina atômica de Fukushima se mantêm acima do tolerável depois de ser atingida por um tsunami.

Prosseguem as rebeliões populares em países do oriente médio; estados asiáticos e africanos entram em convulsão.

Na Inglaterra, 300 mil pessoas protestam contra cortes nos serviços públicos, na maior manifestação popular do gênero em décadas.

Facebook bate recorde de acessos na Inglaterra e pela primeira vez supera visitas a sites pornográficos.

O Facebook extingue uma conta ligada à Terceira Intifada, nome dado à onda de protestos dos palestinos contra Israel.

Pouco antes de cair do 7º andar do prédio onde morava, a atriz Cibele Dorsa postou no Twitter uma mensagem de despedida.

O jornalista Thiago Laifert anuncia o fim da sua conta no twitter devido à agressividade dos seus seguidores. Voltou atrás na decisão.

A Rede Globo ignora o Clube dos 13 e negocia diretamente com os clubes os contratos de transmissão dos jogos do campeonato brasileiro de 2012.

A diretoria do Corinthians tenta, sem sucesso, apresentar o jogador Adriano, vulgo Imperador, no Museu do Ipiranga, principal referência histórica sobre a Independência do Brasil.

Exército abole comemoração do golpe de 64, mas clubes militares prestam homenagem à data.
Prosseguem os trabalhos para tentar descobrir o paradeiro dos corpos dos guerrilheiros mortos no Araguaia, durante a ditadura militar.

Jair Bolsonaro, ex-capitão do exército, comparece ao velório do ex-vice-presidente José Alencar e reafirma a sua posição sobre homossexualismo e cotas para negros nas universidades.

Lula chora no velório do ex-vice-presidente. Pouco antes, ele foi homenageado pela Universidade de Coimbra, em Portugal.

A suposta filha de José Alencar não vai ao velório. O processo sobre a sua paternidade está na justiça. Alencar se recusou a fazer o exame de DNA.

A presidenta Dilma lança a rede Cegonha, programa voltado à gestante. Um dos objetivos é reduzir o número de cesarianas no País.

A USP da Zona Leste pretende extinguir o curso superior de Obstetrícia. Mães que tiveram filhos de parto normal protestam.

Jair se defende na Comissão de Ética da Câmara.
Maria planeja fazer novelas.
Globo lança o BBB 12.
Suposto assassino das irmãs está foragido.
Preta Gil lança oficialmente a Parada Gay deste ano.
Obama dá apoio secreto aos rebeldes da Líbia.
Major Curió é preso por ocultar documentos do Araguaia.
Estádio da Copa será na zona leste de São Paulo.
Dilma Roussef programa viagem à China.
Revista Caras sofre censura de ex-marido de Cibele Dorsa.
Sistema de saúde inglês será privatizado.
Bomba explode em Jerusalém.
Facebook permitirá converter perfil pessoal em página oficial.
Japoneses e alemães pedem fim do uso de energia nuclear.

Quem disse que a vida neste planeta é caótica? Tudo sempre se encaixa...

*Robert Altman pode não ter sido o maior diretor de cinema dos EUA, mas, sem dúvida, foi o mais iconoclasta. “Shortcuts, Cenas da Vida” foi uma das suas obras-primas.